Pular para o conteúdo principal

A HISTÓRIA DOS SEGUIDORES DE YESHUA

 


O propósito deste estudo é apresentar alguns relatos históricos dos judeus que creram em Yeshua, durante o período de 35 a 150 d.C. (aproximadamente) ou seja, dos primeiros crentes, das suas crenças e práticas, do seu relacionamento com os demais grupos judaicos e posteriormente com as congregações dos gentios.

 

Há muita coisa que não iremos tratar aqui. Você pode ler diretamente no livro de Atos, apesar de comentarmos algumas das coisas que estão escritas lá.

 

OS SEGMENTOS DO JUDAÍSMO DO PRIMEIRO SÉCULO

 

Sabemos por meio dos historiadores, das profecias do livro de Daniel, dos Targums (interpretações da Tanach em aramaico) e de outras literaturas rabínicas que havia muitos segmentos (seitas) judaicas na época de Yeshua e todos aguardavam pela chegada do Messias. Essas seitas normalmente se agrupavam em quatro principais grupos: Fariseus, Saduceus, Essênios e Zelotes.

 

Segundo alguns historiadores, esses grupos podiam ser constituídos de 24 a 40 subgrupos, cada um com suas doutrinas distintas entre si, mostrando que o Judaísmo daquela época era muito mais diversificado do que nos séculos posteriores. Eles tinham diferentes ideias sobre como observar a Torah (as Leis de YHWH), sobre a inspiração do restante das Escrituras, sobre livros que não se encontram na Tanach (“Antigo Testamento”), sobre o calendário, sobre o Messias, sobre a ressurreição etc.

 

Eles frequentemente perseguiam uns aos outros e às vezes se uniam para lutar contra um inimigo externo comum. Todos eles, contudo, aceitavam uns aos outros como sendo parte legítima do Judaísmo, e não de religiões diferentes. Os judeus que creram em Yeshua como Messias era mais um desses segmentos, totalmente aceito como parte do Judaísmo.

 

OS CONFLITOS ENTRE OS SEGMENTOS

 

Assim como outros grupos do Judaísmo, havia conflitos ocasionais entre os Nazarenos e os demais segmentos do Judaísmo (assim como ainda ocorre hoje em dia entre diferentes segmentos do Judaísmo ou até mesmo entre diferentes segmentos do Cristianismo).

 

Em alguns momentos havia muita violência. No período de, aproximadamente, 25 anos relatados no livro de Atos, as congregações nazarenas (sendo a principal delas em Jerusalém) estiveram envolvidas em pelo ao menos cinco conflitos com outros segmentos do Judaísmo (5 em 25 anos não é tanto assim). Se o leitor for familiarizado com o Judaísmo, perceberá que isso é comum (vide Hillel e Shammai, por exemplo).

 

Estes desentendimentos eram dentro do Judaísmo - ninguém estava dizendo que os Nazarenos não fossem parte legítima do Judaísmo. Assim como Yeshua discutia com os Fariseus, o que também eram discussões internas. Ele era duro com eles por sentir que eles eram teologicamente capazes de entender suas colocações. Vamos olhar rapidamente para dois destes conflitos em Atos para ter uma percepção melhor do que foram esses conflitos.

 

EXEMPLOS DE CONFLITOS COM OS NAZARENOS

 

E Pedro e João subiam juntos ao templo à hora da oração, a nona. E era trazido um homem que desde o ventre de sua mãe era coxo, o qual todos os dias punham à porta do templo, chamada Formosa, para pedir esmola aos que entravam. O qual, vendo a Pedro e a João que iam entrando no templo, pediu que lhe dessem uma esmola. E Pedro, com João, fitando os olhos nele, disse: Olha para nós. E olhou para eles, esperando receber deles alguma coisa. E disse Pedro: Não tenho prata nem ouro; mas o que tenho isso te dou. Em nome de Yeshua HaMashiach, o Nazareno, levanta-te e anda. E, tomando-o pela mão direita, o levantou, e logo os seus pés e artelhos se firmaram. E, saltando-o, pôs-se em pé, e andou, e entrou com eles no templo, andando, e saltando, e louvando a Elohim. E todo o povo o viu andar e louvar a Elohim; E conheciam-no, pois era ele o que se assentava a pedir esmola à porta Formosa do templo; e ficaram cheios de pasmo e assombro, pelo que lhe acontecera. E, apegando-se o coxo, que fora curado, a Pedro e João, todo o povo correu atônito para junto deles, ao alpendre chamado de Salomão. E quando Pedro viu isto, disse ao povo: Homens israelitas, por que vos maravilhais disto? Ou, por que olhais tanto para nós, como se por nossa própria virtude ou santidade fizéssemos andar este homem? O Elohim de Abraão, de Isaque e de Jacó, o Elohim de nossos pais, glorificou a seu filho Yeshua, a quem vós entregastes e perante a face de Pilatos negastes, tendo ele determinado que fosse solto. Mas vós negastes o Santo e o Justo, e pedistes que se vos desse um homem homicida. E matastes o Príncipe da vida, ao qual Elohim ressuscitou dentre os mortos, do que nós somos testemunhas. E pela fé no seu nome fez o seu nome fortalecer a este que vedes e conheceis; sim, a fé que vem por ele, deu a este, na presença de todos vós, esta perfeita saúde. (Atos 3:1-16)

 

Vemos que Kefa (Pedro) e Yochanan (João) estavam no Templo. Por que estavam lá? Era hora de daven minchá (serviço da tarde) e eles eram judeus observantes. Havia um homem aleijado no portão. Por quê?

 

Porque ele não podia entrar no Templo, pois pessoas aleijadas não tinham permissão de entrar. Não sendo permitido a ele entrar, ele ficou o mais próximo que pôde. Eles o curaram e a primeira coisa que ele fez foi entrar no Templo para expressar o seu amor por YHWH e mostrar às pessoas e possivelmente ao sacerdote. As pessoas viram o milagre e Kefa (Pedro) usou a oportunidade para falar de Yeshua. Até então, não havia problema. Vamos continuar e ler Atos 4.1-2:

 

E, estando eles falando ao povo, sobrevieram os sacerdotes, e o capitão do templo, e os saduceus, Doendo-se muito de que ensinassem o povo, e anunciassem em Jesus a ressurreição dentre os mortos. (Atos 4:1,2)

 

Por que os sacerdotes e os saduceus ficaram irritados?

 

Ficaram irritados porque Kefa e Yochanan estavam pregando a ressurreição dos mortos, que é uma doutrina que os Saduceus (e os sacerdotes também eram saduceus) não aceitavam. Posteriormente, eles os soltaram. Esta foi uma discussão teológica sobre a ressurreição. Os Nazarenos não estavam pregando uma nova religião; ainda era o Judaísmo. Se os fariseus tentassem ensinar sobre a ressurreição dentro do Templo, provavelmente a mesma coisa teria acontecido.

 

Vamos para o segundo conflito:

 

E muitos sinais e prodígios eram feitos entre o povo pelas mãos dos apóstolos. E estavam todos unanimemente no alpendre de Salomão. Dos outros, porém, ninguém ousava ajuntar-se a eles; mas o povo tinha-os em grande estima. E a multidão dos que criam no Senhor, tanto homens como mulheres, cresciam cada vez mais. De sorte que transportavam os enfermos para as ruas, e os punham em leitos e em camilhas para que ao menos a sombra de Pedro, quando este passasse, cobrisse alguns deles. E até das cidades circunvizinhas concorria muita gente a Jerusalém, conduzindo enfermos e atormentados de espíritos imundos; os quais eram todos curados. E, levantando-se o sumo sacerdote, e todos os que estavam com ele (e eram eles da seita dos saduceus), encheram-se de inveja, E lançaram mão dos apóstolos, e os puseram na prisão pública. (Atos 5:12-18)

 

Mais uma vez temos prisões sendo efetuadas por parte dos Saduceus. Desta vez, no entanto, eles foram levados ao Sanhedrin (o Sinédrio), que continha tanto Fariseus quanto Saduceus:

 

Porém, respondendo Pedro e os apóstolos, disseram: Mais importa obedecer a Elohim do que aos homens. O Elohim de nossos pais ressuscitou a Yeshua, ao qual vós matastes, suspendendo-o no madeiro. Elohim com a sua destra o elevou a Príncipe e Salvador, para dar a Israel o arrependimento e a remissão dos pecados. E nós somos testemunhas acerca destas palavras, nós e o Espírito Santo, que Elohim deu àqueles que lhe obedecem. E, ouvindo eles isto, se enfureciam, e deliberaram matá-los. Mas, levantando-se no conselho um certo Fariseu, chamado Gamaliel, doutor da lei, venerado por todo o povo, mandou que por um pouco levassem para fora os apóstolos; E disse-lhes: Homens israelitas, acautelai-vos a respeito do que haveis de fazer a estes homens, porque antes destes dias levantou-se Teudas, dizendo ser alguém; a este se ajuntou o número de uns quatrocentos homens; o qual foi morto, e todos os que lhe deram ouvidos foram dispersos e reduzidos a nada. Depois deste levantou-se Judas, o galileu, nos dias do alistamento, e levou muito povo após si; mas também este pereceu, e todos os que lhe deram ouvidos foram dispersos. E agora digo-vos: Dai de mão a estes homens, e deixai-os, porque, se este conselho ou esta obra é de homens, se desfará, mas, se é de Elohim, não podereis desfazê-la; para que não aconteça serdes também achados combatendo contra Elohim. E concordaram com ele. E, chamando os apóstolos, e tendo-os açoitado, mandaram que não falassem no nome de Yeshua, e os deixaram ir. (Atos 5:29-40)

 

Quem estava do lado deles? Um fariseu! Ele acreditava na ressurreição. A ressurreição era o problema (veja o texto em destaque). Eles não foram acusados de iniciar uma nova religião, caso contrário os Fariseus teriam se unido aos Saduceus. Estava tudo, novamente, dentro do contexto do Judaísmo.

 

OS SEGUIDORES DE YESHUA

 

Normalmente, os nomes são dados por terceiros, porém Sha'ul [Paulo] assim identificava os seguidores de Yeshua como pode ser visto nas passagens a seguir:

 

Mas, como alguns deles se endurecessem e não obedecessem, falando mal do Caminho perante a multidão, retirou-se deles, e separou os discípulos, disputando todos os dias na escola de um certo Tirano. (Atos 19:9)

 

Mas confesso-te isto que, conforme aquele Caminho que chamam seita, assim sirvo ao Elohim de nossos pais, crendo tudo quanto está escrito na Lei e nos Profetas. (Atos 24:14)

 

Já os acusadores de Sha’ul preferiam chamá-los “seita dos nazarenos” (Atos 24.5). O significado da palavra “nazarenos” provém da raiz hebraica נצר (Netser), que significa “Renovo”, sentido em que é aplicado a Yeshua, aquele que é designado na Palavra como “O Renovo”:

 

Porque brotará um rebento do tronco de Jessé, e das suas raízes um renovo frutificará. E repousará sobre ele o Espírito do Senhor, o espírito de sabedoria e de entendimento, o espírito de conselho e de fortaleza, o espírito de conhecimento e de temor do Senhor. E deleitar-se-á no temor do Senhor; e não julgará segundo a vista dos seus olhos, nem repreenderá segundo o ouvir dos seus ouvidos. Mas julgará com justiça aos pobres, e repreenderá com equidade aos mansos da terra; e ferirá a terra com a vara de sua boca, e com o sopro dos seus lábios matará ao ímpio, e a justiça será o cinto dos seus lombos, e a fidelidade o cinto dos seus rins. (Isaías 11:1-5)

 

Enquanto isso, a palavra “cristão” aparece em Atos 11.26, 26.26 e em 1 Pedro 4.16. Inicialmente era considerada uma palavra ofensiva, usada por pagãos para se referir aos crentes em Yeshua. Eles normalmente não se chamavam de “cristãos” até cerca de 180 d.C., em uma época em que já eram um grupo totalmente diferente daquele de Atos.

 

OS GENTIOS E OS NAZARENOS

 

À medida em que vemos Sha'ul indo à Diáspora, basicamente ensinando em sinagogas ou para congregações mistas de judeus e gentios tementes a YHWH, ocorreram desentendimentos sobre o quanto da Torah aqueles gentios deveriam observar inicialmente, para serem admitidos no convívio da comunidade.

 

A fim de colocar um ponto final sobre a celeuma, o conselho reunido em Atos 15 tomou uma posição bastante tolerante, a qual permitiu que mais gentios entrassem no convívio dos crentes:

 

Por isso julgo que não se deve perturbar aqueles, dentre os gentios, que se convertem a Elohim. Mas escrever-lhes que se abstenham das contaminações dos ídolos, da fornicação, do que é sufocado e do sangue. Porque Moisés, desde os tempos antigos, tem em cada cidade quem o pregue, e cada sábado é lido nas sinagogas. (Atos 15:19-21)

 

Curiosamente, 250 anos depois Roma tomou uma posição intolerante quando disse que os judeus que cressem em Yeshua deveriam deixar a Torah de lado para serem “verdadeiros” crentes. Por volta do ano 70 d.C., o número de gentios crentes em Yeshua muito provavelmente já ultrapassava o de judeus.

 

AS CRENÇAS DOS NAZARENOS DO 1º SÉCULO

 

No que cria este segmento do Judaísmo chamado de Notzrim? Eles frequentavam sinagogas e o Templo, faziam votos de Nazireu, os sacrifícios previstos e guardavam as festas bíblicas e a Torah. Eles também criam nos outros livros da Tanach e nas Escrituras do Brit Chadasha (“Novo Testamento”) à medida em que se tornavam disponíveis (é importante ressaltar que eles as entendiam em seu contexto judaico original).

 

Eles aceitavam os costumes do Judaísmo. E por costume estou me referindo à palavra grega “ethos” que normalmente está relacionada às Leis de Moisés (Atos 6.14, 21.21). Eles nem sempre aceitavam as tradições (Paradoses no grego) ou Halacha (decisões referentes a tais tradições) dos Fariseus. Eles anunciavam às Boas Novas tanto a judeus quanto a gentios (alguns segmentos dentro do Farisaísmo também faziam à mesma coisa) e, principalmente, acreditavam que Yeshua era o Messias. Todas essas crenças eram perfeitamente compatíveis com o Judaísmo como um todo.

 

AUTORIDADE DADA POR YESHUA

 

E eu te darei as chaves do reino dos céus; e tudo o que ligares na terra será ligado nos céus, e tudo o que desligares na terra será desligado nos céus. (Mateus 16:19)

 

A palavra “ligar” no hebraico é empregada para proibir, enquanto “desligar” no hebraico é empregada para permitir. Este verso não tem nada a ver com guerra espiritual, como frequentemente é usado hoje em dia. Yeshua estava dando aos discípulos a autoridade para fazer Halachá (decidir sobre formas de se cumprir a Lei). Em outras palavras, as decisões teológicas que eles tomassem seriam aceitas nos céus.

 

A Torah tem instruções de Elohim para o Seu povo, mas em muitas ocasiões não menciona os detalhes. Como devemos guardar o Shabat (exemplo: podemos dirigir?) ou como fazer a Pessach (a “Páscoa” judaica)? Como tornar a carne pura para comer? Existem centenas de perguntas como esta. Como resultado destas perguntas, os fariseus (e outros) desenvolveram um sistema de tradições orais que eram bem elaboradas sobre como fazer estas coisas.

 

Algumas de suas tradições (Halachá) eram excelentes, algumas eram neutras, e outras eram tão excessivas que violavam a letra e/ou o espírito dos mandamentos. Os do Caminho rejeitaram a Halachá farisaica como autoridade final para fazer a sua própria Halachá. Eles adotaram algumas, rejeitaram outras e fizeram suas próprias.

 

Eles fizeram isso porque Yeshua deu a eles autoridade para fazê-lo (Mt. 16:19). Yeshua e os discípulos nem sempre concordavam com a tradição oral (Mt. 15:1-11, Mt 12:1-8 etc.). E Yeshua havia prometido dar a eles a Ruach HaKodesh (Espírito Santo) para ajudá-los a tomar tais decisões (João 16:13, etc.)

 

OS LÍDERES ATRAVÉS DO TEMPO

 

Este segmento frutificou e muitos judeus e gentios se tornaram parte dele (Atos 6.7). Dentre estes provavelmente havia sacerdotes essênios, pois eles também criam na ressurreição (Atos 21.20). A maioria dos primeiros crentes gentios eram pessoas tementes à YHWH que haviam ouvido a Sha’ul pregar nas sinagogas (Atos 17.1-4, 18.4, etc.)

 

Por volta do ano 60 d.C. Ya’akov (Tiago), irmão de Yeshua, era o líder dos Nazarenos e o havia sido provavelmente por cerca de 20 anos ou mais. Em 62 d.C., de acordo com Josefo (conhecido historiador judeu), Ya’akov foi preso pelo sacerdote chefe (um saduceu) em uma época em que não havia governador romano em Jerusalém. O sacerdote chefe o atirou de um pináculo do Templo e, como ele não morreu, o espancou até a morte. Ya’akov era muito respeitado mesmo dentre aqueles que não criam em Yeshua. Ele passava muito tempo no Templo em oração.

 

Quando o novo governador romano veio a Jerusalém, a morte de Ya’akov foi protestada. Mas por quem?

 

Pelos fariseus! Eles teriam feito isso se ele não fosse parte do Judaísmo, mas ao invés disso, fosse parte de uma nova religião herética? Claro que não! A morte dele foi um duro golpe para a comunidade dos Nazarenos porque ele havia sido o seu líder por muito tempo.

 

Ele foi substituído por um primo de Yeshua – Shimon Ben Clofa – que foi escolhido pelos anciãos. Shimon serviu a comunidade por cerca de 50 anos. Nos últimos 18 anos antes da rebelião de Bar Kochba, os Nazarenos tiveram cerca de 13 líderes diferentes (todos judeus). Depois de Bar Kochba, os crentes de origem gentia passaram a liderar o grupo.

 

A REBELIÃO DOS JUDEUS CONTRA ROMA

 

Em 66 d.C. ocorreu uma rebelião contra Roma. Os crentes em Yeshua podem ou não terem se envolvido. Os historiadores ainda não sabem isso ao certo. O que se sabe é que os crentes em Yeshua receberam a revelação (uma fonte diz que foi diretamente de Yeshua e outra de que foi através de um anjo) de que Jerusalém seria destruída e que eles deveriam ir para Pella. Este foi o segundo aviso, o primeiro tendo sido em Mateus 24.15-16. Pella era uma cidade na Decápolis (atualmente é parte da Jordânia). Era uma cidade grega aproximadamente 24 km do sul do Mar da Galiléia, bem próxima a Skitópolis, que atualmente é chamada de Bet Shean.

 

Sabemos que Yeshua havia passado por lá, pois era a principal estrada da Galiléia para Jerusalém se não passarmos por Samaria. Sabemos ainda que Yeshua pregou na Decápolis, e que Pella tinha uma população judaica considerável e que era a intercessão de grandes rotas de comércio. Foi provavelmente naquela época que Ele pregou em Pella e em 66 d.C. já havia por lá uma comunidade de Nazarenos.

 

Sabe-se que a maior parte dos Nazarenos em Jerusalém, durante a revolta, conseguiu escapar para Pella. Depois da guerra, muitos voltaram a Jerusalém. Alguns ficaram em Pella e outros se mudaram para outros locais. Os Nazarenos continuaram a observar a Torah, não necessariamente da forma farisaica.

 

O JUDAÍSMO APÓS O ANO 70 D.C.

 

Os Nazarenos nunca deixaram o Judaísmo. Eles continuaram a observar a Torah, mas nem sempre da mesma forma que os fariseus ou dos outros segmentos. Com a destruição de Jerusalém e do Templo ocorrida em 70 d.C., o grupo dos Saduceus e dos Zelotes deixaram de existir, assim como os Essênios (a comunidade de Qu’ram também foi destruída). Os únicos grupos remanescentes do Judaísmo eram os Fariseus e os Nazarenos.

 

O líder dos Fariseus durante os anos de 66-70 d.C. era Yochanan Ben Zakkai. Ele também percebeu que a destruição de Jerusalém era iminente e escapou com muitos de seus discípulos. Para isso ele teve que fingir seu próprio funeral e seus discípulos o levaram para fora de Jerusalém.

 

Naquela época, os romanos deixavam os judeus saírem. Porém, os zelotes não, pois precisavam de ajuda para lutar contra Roma, então Yochanan pôs este plano em ação. Depois de sair de Jerusalém, ele foi até o governador Vespasiano.

 

Conta a História que ele se dirigiu a Vespasiano como “Imperador”, e antes que Vespasiano pudesse corrigi-lo, um mensageiro entrou e disse que o Imperador havia morrido e que Vespasiano era o novo Imperador (esta é uma versão abreviada da história). Yochanan ganhou o favor de Vespasiano, que o deixou ir para Yavneh, cidade litorânea, e lá começar uma escola de estudos da Torah.

 

AS SEMENTES DO JUDAÍSMO RABÍNICO

 

Antes de 70 d.C., havia muito mais judeus e eles podiam se dar ao luxo de permitir diversos segmentos e opiniões. Com o número de judeus drasticamente reduzido e o Templo destruído, Yochanan percebeu que para sobrevivência do Judaísmo, eles precisariam se unir. A partir de então começaram a codificar as tradições orais e a concordar em teologia e doutrina. Isto levou muitos anos e houve muitas disputas, uma vez que existiam muitas crenças em meio aos fariseus.

 

A maior delas foi talvez entre Gamliel II e Rabi Akiva, no início do segundo século. Gamliel II achava que o Judaísmo precisava apenas de algumas pequenas mudanças, enquanto Akiva considerava ser necessário criar um sistema que desse todo o poder e autoridade aos rabinos. Ele ganhou a disputa com Gamliel em uma batalha que foi cheia de malícia de ambos os lados.

 

Rabi Akiva sistematizou o Judaísmo por meio da sua Halachá, a qual indicava que a lei oral foi dada ao mesmo tempo da Torah (Lei) de Moisés:

 

Quando o Santo veio dar a Torá para Moshé, Ele disse sobre a ordem das Leituras, a Mishná, a Hagadá e o Talmud, pois diz "E D'us falou todas essas palavras ..." (Shemot 20:1), até mesmo o que um aluno experiente perguntaria ao seu professor. O Santo disse a ele “vá e ensine aos filhos de Israel ..." (Devarim 31:19). Moshé respondeu: “Mestre do mundo, escreva para seus filhos!” D'us disse a ele, “Eu quero dar a eles por escrito, mas foi revelado diante de mim que no futuro as nações do mundo irão governá-los e tirarão deles. Então meus filhos serão como as nações!” Então Moshé disse “dê-lhes as Leituras na forma escrita e a Hagadá, Mishnah e o Talmud oralmente”. (Yalkut Shimoni 405:1)

 

Ele, portanto, deu à mente judaica não apenas um novo campo para seu próprio emprego, mas, convencido da imutabilidade da Sagrada Escritura e da necessidade de desenvolvimento no Judaísmo, ele conseguiu reconciliar esses dois opostos por meio da sua halachá. Os frutos desse trabalho resultaram no que hoje é o Judaísmo Ortodoxo.

 

OS FARISEUS E OS NAZARENOS

 

Os fariseus estavam sediados em Yavneh e os do Caminho (Nazarenos) em Pella. A cisma de antes era apenas uma discussão interna. Mas após a destruição de Jerusalém, estavam se distanciando de forma considerável e uma ruptura total era inevitável. Os rabinos de Akiva começaram a trazer novas regras e teologia. Isto era em parte necessário para que tivessem o Judaísmo sem o Templo e os sacrifícios de sangue. Antes do Templo ser destruído, a Escola Farisaica de Shammai (com quem Yeshua tinha grandes discordâncias) predominava. Em Yavneh eles decidiram que, dali em diante, a Escola de Hillel predominaria. Os sacrifícios foram substituídos por orações e atos de caridade.

 

É claro que nem todas as decisões deles foram ruins. Eles tinham uma tarefa difícil, havia conflitos de poder e muitas decisões foram problemáticas. Os do Caminho que anteriormente eram basicamente tolerados (embora, é claro, houvesse algum conflito) agora eram vistos como uma grande ameaça à unidade e sobrevivência do Judaísmo, porque eles não aceitavam a autoridade final dos rabinos fariseus. Além disto, o grande número de gentios que estavam se juntando aos do Caminho era considerado problemático.

 

Havia muitas regras a se considerar. Sem o Templo, como se deve tocar o shofar no Yom Kippur e em Yom Teruah? Antes isto só era feito no Templo. Leva-se o luvav para fora de Jerusalém no Sukkot? Havia centenas de decisões iguais a estas a serem feitas e os fariseus queriam que elas fossem feitas para todos dentro do Judaísmo.

 

A CRESCENTE SEPARAÇÃO

 

Aproximadamente em nas décadas de 80/90 d.C., em muitos lugares os do Caminho (Nazarenos) ainda estavam adorando a Elohim nas sinagogas, juntamente com os fariseus, e novamente eram considerados uma ameaça. Para remediar a situação, os fariseus adicionaram uma “bênção” na Amidah (oração central da liturgia judaica, na tradição rabínica). Foi inserida como a de número 12 e foi chamada de Birkot HaMinim. Não era universalmente praticada em todas as sinagogas, mas era uma “bênção” contra os minim e dizia algo do tipo:

 

Para os apóstatas (meshumaddim) que não haja esperança e desenraizem o reino da arrogância (malkhut zadom), rapidamente e em nossos dias. Que os nazarenos (ha-naẓarim/noṣrim/notzrim) e os sectários (minim) morram como em um momento. Que eles sejam apagados do livro da vida, e não sejam escritos junto com os justos. Bendito sejas Tu, Eterno, que quebra os inimigos e subjuga os iníquos

 

Ora, os do Caminho obedeciam sim à Torah, só que não à maneira farisaica. Esta “bênção” foi inserida para separar os Nazarenos do Judaísmo Rabínico.

 

Ao contrário do restante da Amidah, que era feita silenciosamente e de forma bem suave, esta “bênção” tinha que ser recitada em alto e bom som. Se você fosse nazareno, as suas opções seriam deixar a sinagoga ou amaldiçoar a si mesmo. Isto, é claro, separou os nazarenos dos fariseus ainda mais, mas até certo ponto ainda havia diálogo entre eles até a metade do II século e alguns deles podem ser lidos no Talmud.

 

O INÍCIO DO ANTISSEMITISMO DE ROMA

 

O Judaísmo era uma religião permitida por Roma. Os Romanos permitiam que eles não trabalhassem no Shabat e os eximiam de fazerem sacrifícios a César (em troca eles faziam sacrifícios “por César”). Os nazarenos, é claro, estavam entre os judeus.

 

Os romanos notaram a expulsão dos nazarenos das sinagogas com grande suspeita. Com frequência os privilégios eram removidos. E quando isso acontecia, os nazarenos tinham que se esconder ou aceitar punições. Roma nunca aceitaria uma nova religião.

 

Alguns destes crentes gentios tentaram convencer os romanos de que eram os sucessores do Judaísmo e que, por isso, deveriam ter os mesmos privilégios que os judeus; eles se diziam os verdadeiros herdeiros do Judaísmo. Foi a partir desse ponto que começaram a surgir (embora consolidados com mais força na época de Constantino) as primeiras sementes da satânica Teologia da Substituição e do antissemitismo entre os seguidores de Yeshua.

 

A CARTADA FINAL DE RABI AKIVA

 

Em 135 DC, iniciou a rebelião de Bar Kochba contra Roma. Rabi Akiva declarou que Bar Kochba era o messias (alguns dizem que isto foi para fazer a cisão final com os do Caminho/Nazarenos, pois eles lutariam sob a bandeira de um messias diferente). Muitos fariseus também não aceitavam Bar Kochba como messias, mas ainda sim muitos lutaram (uma vez que não tinham Yeshua como Messias).

 

Durante aquele período, os rabinos declararam que a leitura de qualquer livro minim (incluindo o que é conhecido hoje como “Novo Testamento”) tornava uma pessoa impura e que os livros deveriam ser queimados. Akiva disse que aqueles que lessem os livros minim não tomariam parte no mundo vindouro (apesar de contradizer a própria Mishnah). Até mesmo os rolos da Torah que fossem escritos pelos minim eram considerados dignos de serem queimados. A separação estava concluída.

 

Este estudo foi baseado em pesquisa de Ray Pritz, da Universidade Hebraica de Jerusalém

Texto corrigido e adaptado por Francisco Adriano Germano

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

A INCOERÊNCIA TEOLÓGICA

    Dias atrás estava conversando com alguns evangélicos e sobre o porquê de seguirem aquilo que seguem. Por exemplo: a mulher não poder usar calça, o crente não poder fazer tatuagens, dentre outras coisas.   Quando questionados, claramente em alto e bom som, a maioria fala que não! Retruquei com um simples por quê? Um respondeu: - "Acho que pode sim, não vejo problema algum!"   Outro contrariando, falou: - "O pastor diz que a mulher não pode usar calça e pronto!"   E outro complementou: - "O pastor disse, mas eu não vejo nada na Bíblia que fala de mulher não poder usar calça!"   Um mais ferrenho disse: - "Isto é doutrina, então deve ser seguido!"   Aí perguntei: - "Doutrina? Baseada em que? Por acaso está na Bíblia?"   Recebi uma resposta: - "Tem sim! Na Bíblia, numa parte fala que a mulher não pode usar roupa de homem, e homem não pode usar roupa de mulher!"   Está aí a resposta, ent

EM QUE DIA MORREU YESHUA: SEXTA OU QUARTA-FEIRA?

    É verdade que Yeshua (Jesus) ressuscitou no domingo de manhã? Alguns advogam que o domingo se tornou o dia de guarda, baseados nesta ideia. Seria isto verdade? É certo considerar parte de um dia, como sendo 24 horas?   O MASHIACH E O SINAL DE JONAS   Sem levar em conta a história de Jonas, não haveria prova positiva com a qual refutar o protesto de que o Mashiach (Messias) da Bíblia era um impostor; porque Ele mesmo disse para alguns incrédulos escribas e fariseus, os quais duvidaram de sua verdadeira identidade, embora o tenham visto fazer milagres, que não seria dado outro sinal além daquele de Jonas, para justificar a sua afirmação messiânica.   Então alguns escribas e fariseus lhe disseram: Mestre, gostaríamos de ver da tua parte algum sinal. E Ele lhes respondeu: Uma geração má e adúltera pede um sinal, porém não se lhe dará outro sinal senão o do profeta Jonas. Pois como Jonas esteve três dias e três noites no ventre do grande peixe, assim estará o Filho do home

FÉ NO FUTURO

    Alguma medida do radicalismo que é introduzido no mundo pela história do Êxodo pode ser vista na tradução errada das três palavras-chave com as quais Elohim Se identificou a Moisés na Sarça Ardente.   A princípio, Ele se descreveu assim:   “Eu sou o Elohim de teu pai, o Elohim de Abraão, o Elohim de Isaque e o Elohim de Jacó” .   Mas então, depois que Moisés ouviu a missão para a qual seria enviado, ele disse a Elohim:   “ Suponha que eu vá aos israelitas e lhes diga: 'O Elohim de seus pais me enviou a vocês', e eles me perguntam: 'Qual é o nome dele?' Então o que devo dizer a eles? Foi então que Elohim respondeu, enigmaticamente, Ehyeh Asher Ehyeh (Ex. 3:14).   Isto foi traduzido para o grego como ego eimi ho on , e para o latim como ego sum qui sum , significando 'Eu sou quem sou', ou 'Eu sou Aquele que é'. Todos os teólogos cristãos primitivos e medievais entenderam que a frase falava de ontologia, a natureza metafísica da e