O propósito deste estudo é
apresentar alguns relatos históricos dos judeus que creram em Yeshua, durante o
período de 35 a 150 d.C. (aproximadamente) ou seja, dos primeiros crentes, das suas
crenças e práticas, do seu relacionamento com os demais grupos judaicos e
posteriormente com as congregações dos gentios.
Há muita coisa que não iremos
tratar aqui. Você pode ler diretamente no livro de Atos, apesar de comentarmos
algumas das coisas que estão escritas lá.
OS SEGMENTOS DO JUDAÍSMO DO
PRIMEIRO SÉCULO
Sabemos por meio dos
historiadores, das profecias do livro de Daniel, dos Targums (interpretações da
Tanach em aramaico) e de outras literaturas rabínicas que havia muitos
segmentos (seitas) judaicas na época de Yeshua e todos aguardavam pela chegada
do Messias. Essas seitas normalmente se agrupavam em quatro principais grupos:
Fariseus, Saduceus, Essênios e Zelotes.
Segundo alguns historiadores, esses
grupos podiam ser constituídos de 24 a 40 subgrupos, cada um com suas doutrinas
distintas entre si, mostrando que o Judaísmo daquela época era muito mais
diversificado do que nos séculos posteriores. Eles tinham diferentes ideias
sobre como observar a Torah (as Leis de YHWH), sobre a inspiração do restante
das Escrituras, sobre livros que não se encontram na Tanach (“Antigo Testamento”),
sobre o calendário, sobre o Messias, sobre a ressurreição etc.
Eles frequentemente perseguiam
uns aos outros e às vezes se uniam para lutar contra um inimigo externo comum.
Todos eles, contudo, aceitavam uns aos outros como sendo parte legítima
do Judaísmo, e não de religiões diferentes. Os judeus que creram em Yeshua como
Messias era mais um desses segmentos, totalmente aceito como parte do Judaísmo.
OS CONFLITOS ENTRE OS
SEGMENTOS
Assim como outros grupos do
Judaísmo, havia conflitos ocasionais entre os Nazarenos e os demais segmentos
do Judaísmo (assim como ainda ocorre hoje em dia entre diferentes segmentos do
Judaísmo ou até mesmo entre diferentes segmentos do Cristianismo).
Em alguns momentos havia muita
violência. No período de, aproximadamente, 25 anos relatados no livro de Atos,
as congregações nazarenas (sendo a principal delas em Jerusalém) estiveram
envolvidas em pelo ao menos cinco conflitos com outros segmentos do Judaísmo (5
em 25 anos não é tanto assim). Se o leitor for familiarizado com o Judaísmo,
perceberá que isso é comum (vide Hillel e Shammai, por exemplo).
Estes desentendimentos eram
dentro do Judaísmo - ninguém estava dizendo que os Nazarenos não fossem parte
legítima do Judaísmo. Assim como Yeshua discutia com os Fariseus, o que também
eram discussões internas. Ele era duro com eles por sentir que eles eram
teologicamente capazes de entender suas colocações. Vamos olhar rapidamente
para dois destes conflitos em Atos para ter uma percepção melhor do que foram
esses conflitos.
EXEMPLOS DE CONFLITOS COM
OS NAZARENOS
E Pedro e João
subiam juntos ao templo à hora da oração, a nona. E era trazido um homem que
desde o ventre de sua mãe era coxo, o qual todos os dias punham à porta do
templo, chamada Formosa, para pedir esmola aos que entravam. O qual, vendo a
Pedro e a João que iam entrando no templo, pediu que lhe dessem uma esmola. E
Pedro, com João, fitando os olhos nele, disse: Olha para nós. E olhou para
eles, esperando receber deles alguma coisa. E disse Pedro: Não tenho prata nem
ouro; mas o que tenho isso te dou. Em nome de Yeshua HaMashiach, o Nazareno,
levanta-te e anda. E, tomando-o pela mão direita, o levantou, e logo os seus
pés e artelhos se firmaram. E, saltando-o, pôs-se em pé, e andou, e entrou com
eles no templo, andando, e saltando, e louvando a Elohim. E todo o povo o viu
andar e louvar a Elohim; E conheciam-no, pois era ele o que se assentava a
pedir esmola à porta Formosa do templo; e ficaram cheios de pasmo e assombro,
pelo que lhe acontecera. E, apegando-se o coxo, que fora curado, a Pedro e
João, todo o povo correu atônito para junto deles, ao alpendre chamado de
Salomão. E quando Pedro viu isto, disse ao povo: Homens israelitas, por que vos
maravilhais disto? Ou, por que olhais tanto para nós, como se por nossa própria
virtude ou santidade fizéssemos andar este homem? O Elohim de Abraão, de Isaque
e de Jacó, o Elohim de nossos pais, glorificou a seu filho Yeshua, a quem vós
entregastes e perante a face de Pilatos negastes, tendo ele determinado que
fosse solto. Mas vós negastes o Santo e o Justo, e pedistes que se vos desse um
homem homicida. E matastes o Príncipe da vida, ao qual Elohim ressuscitou
dentre os mortos, do que nós somos testemunhas. E pela fé no seu nome fez o seu
nome fortalecer a este que vedes e conheceis; sim, a fé que vem por ele, deu a
este, na presença de todos vós, esta perfeita saúde. (Atos 3:1-16)
Vemos que Kefa (Pedro) e Yochanan
(João) estavam no Templo. Por que estavam lá? Era hora de daven minchá
(serviço da tarde) e eles eram judeus observantes. Havia um homem aleijado no
portão. Por quê?
Porque ele não podia entrar no
Templo, pois pessoas aleijadas não tinham permissão de entrar. Não sendo
permitido a ele entrar, ele ficou o mais próximo que pôde. Eles o curaram e a
primeira coisa que ele fez foi entrar no Templo para expressar o seu amor por
YHWH e mostrar às pessoas e possivelmente ao sacerdote. As pessoas viram o
milagre e Kefa (Pedro) usou a oportunidade para falar de Yeshua. Até então, não
havia problema. Vamos continuar e ler Atos 4.1-2:
E, estando eles
falando ao povo, sobrevieram os sacerdotes, e o capitão do templo, e os
saduceus, Doendo-se muito de que ensinassem o povo, e anunciassem em Jesus a
ressurreição dentre os mortos. (Atos 4:1,2)
Por que os sacerdotes e os
saduceus ficaram irritados?
Ficaram irritados porque Kefa e
Yochanan estavam pregando a ressurreição dos mortos, que é uma doutrina que os
Saduceus (e os sacerdotes também eram saduceus) não aceitavam. Posteriormente,
eles os soltaram. Esta foi uma discussão teológica sobre a ressurreição. Os
Nazarenos não estavam pregando uma nova religião; ainda era o Judaísmo.
Se os fariseus tentassem ensinar sobre a ressurreição dentro do Templo,
provavelmente a mesma coisa teria acontecido.
Vamos para o segundo conflito:
E muitos sinais e
prodígios eram feitos entre o povo pelas mãos dos apóstolos. E estavam todos
unanimemente no alpendre de Salomão. Dos outros, porém, ninguém ousava
ajuntar-se a eles; mas o povo tinha-os em grande estima. E a multidão dos que
criam no Senhor, tanto homens como mulheres, cresciam cada vez mais. De sorte
que transportavam os enfermos para as ruas, e os punham em leitos e em camilhas
para que ao menos a sombra de Pedro, quando este passasse, cobrisse alguns
deles. E até das cidades circunvizinhas concorria muita gente a Jerusalém,
conduzindo enfermos e atormentados de espíritos imundos; os quais eram todos
curados. E, levantando-se o sumo sacerdote, e todos os que estavam com ele (e
eram eles da seita dos saduceus), encheram-se de inveja, E lançaram mão dos
apóstolos, e os puseram na prisão pública. (Atos 5:12-18)
Mais uma vez temos prisões sendo
efetuadas por parte dos Saduceus. Desta vez, no entanto, eles foram levados ao
Sanhedrin (o Sinédrio), que continha tanto Fariseus quanto Saduceus:
Porém, respondendo
Pedro e os apóstolos, disseram: Mais importa obedecer a Elohim do que aos
homens. O Elohim de nossos pais ressuscitou a Yeshua, ao qual vós matastes,
suspendendo-o no madeiro. Elohim com a sua destra o elevou a Príncipe e
Salvador, para dar a Israel o arrependimento e a remissão dos pecados. E nós
somos testemunhas acerca destas palavras, nós e o Espírito Santo, que Elohim
deu àqueles que lhe obedecem. E, ouvindo eles isto, se enfureciam, e deliberaram
matá-los. Mas, levantando-se no conselho um certo Fariseu, chamado Gamaliel,
doutor da lei, venerado por todo o povo, mandou que por um pouco levassem para
fora os apóstolos; E disse-lhes: Homens israelitas, acautelai-vos a respeito do
que haveis de fazer a estes homens, porque antes destes dias levantou-se
Teudas, dizendo ser alguém; a este se ajuntou o número de uns quatrocentos
homens; o qual foi morto, e todos os que lhe deram ouvidos foram dispersos e
reduzidos a nada. Depois deste levantou-se Judas, o galileu, nos dias do
alistamento, e levou muito povo após si; mas também este pereceu, e todos os
que lhe deram ouvidos foram dispersos. E agora digo-vos: Dai de mão a estes
homens, e deixai-os, porque, se este conselho ou esta obra é de homens, se desfará,
mas, se é de Elohim, não podereis desfazê-la; para que não aconteça serdes
também achados combatendo contra Elohim. E concordaram com ele. E, chamando os
apóstolos, e tendo-os açoitado, mandaram que não falassem no nome de Yeshua, e
os deixaram ir. (Atos 5:29-40)
Quem estava do lado deles? Um
fariseu! Ele acreditava na ressurreição. A ressurreição era o problema (veja o
texto em destaque). Eles não foram acusados de iniciar uma nova religião, caso
contrário os Fariseus teriam se unido aos Saduceus. Estava tudo, novamente,
dentro do contexto do Judaísmo.
OS SEGUIDORES DE YESHUA
Normalmente, os nomes são dados por
terceiros, porém Sha'ul [Paulo] assim identificava os seguidores de Yeshua como
pode ser visto nas passagens a seguir:
Mas, como alguns
deles se endurecessem e não obedecessem, falando mal do Caminho
perante a multidão, retirou-se deles, e separou os discípulos, disputando todos
os dias na escola de um certo Tirano. (Atos 19:9)
Mas confesso-te
isto que, conforme aquele Caminho que chamam seita, assim sirvo
ao Elohim de nossos pais, crendo tudo quanto está escrito na Lei e nos Profetas.
(Atos 24:14)
Já os acusadores de Sha’ul preferiam
chamá-los “seita dos nazarenos” (Atos 24.5). O significado da palavra “nazarenos”
provém da raiz hebraica נצר (Netser), que significa “Renovo”,
sentido em que é aplicado a Yeshua, aquele que é designado na Palavra como “O
Renovo”:
Porque brotará um
rebento do tronco de Jessé, e das suas raízes um renovo frutificará. E
repousará sobre ele o Espírito do Senhor, o espírito de sabedoria e de
entendimento, o espírito de conselho e de fortaleza, o espírito de conhecimento
e de temor do Senhor. E deleitar-se-á no temor do Senhor; e não julgará segundo
a vista dos seus olhos, nem repreenderá segundo o ouvir dos seus ouvidos. Mas
julgará com justiça aos pobres, e repreenderá com equidade aos mansos da terra;
e ferirá a terra com a vara de sua boca, e com o sopro dos seus lábios matará
ao ímpio, e a justiça será o cinto dos seus lombos, e a fidelidade o cinto dos
seus rins. (Isaías 11:1-5)
Enquanto isso, a palavra “cristão”
aparece em Atos 11.26, 26.26 e em 1 Pedro 4.16. Inicialmente era considerada
uma palavra ofensiva, usada por pagãos para se referir aos crentes em Yeshua.
Eles normalmente não se chamavam de “cristãos” até cerca de 180 d.C., em
uma época em que já eram um grupo totalmente diferente daquele de Atos.
OS GENTIOS E OS NAZARENOS
À medida em que vemos Sha'ul indo
à Diáspora, basicamente ensinando em sinagogas ou para congregações mistas de
judeus e gentios tementes a YHWH, ocorreram desentendimentos sobre o quanto da
Torah aqueles gentios deveriam observar inicialmente, para serem admitidos no
convívio da comunidade.
A fim de colocar um ponto final
sobre a celeuma, o conselho reunido em Atos 15 tomou uma posição bastante
tolerante, a qual permitiu que mais gentios entrassem no convívio dos crentes:
Por isso julgo que
não se deve perturbar aqueles, dentre os gentios, que se convertem a Elohim.
Mas escrever-lhes que se abstenham das contaminações dos ídolos, da fornicação,
do que é sufocado e do sangue. Porque Moisés, desde os tempos antigos, tem em
cada cidade quem o pregue, e cada sábado é lido nas sinagogas. (Atos 15:19-21)
Curiosamente, 250 anos depois Roma
tomou uma posição intolerante quando disse que os judeus que cressem em Yeshua
deveriam deixar a Torah de lado para serem “verdadeiros” crentes. Por
volta do ano 70 d.C., o número de gentios crentes em Yeshua muito provavelmente
já ultrapassava o de judeus.
AS CRENÇAS DOS NAZARENOS DO
1º SÉCULO
No que cria este segmento do
Judaísmo chamado de Notzrim? Eles frequentavam sinagogas e o Templo,
faziam votos de Nazireu, os sacrifícios previstos e guardavam as festas
bíblicas e a Torah. Eles também criam nos outros livros da Tanach e nas
Escrituras do Brit Chadasha (“Novo Testamento”) à medida em que
se tornavam disponíveis (é importante ressaltar que eles as entendiam em seu
contexto judaico original).
Eles aceitavam os costumes do
Judaísmo. E por costume estou me referindo à palavra grega “ethos” que normalmente
está relacionada às Leis de Moisés (Atos 6.14, 21.21). Eles nem sempre
aceitavam as tradições (Paradoses no grego) ou Halacha (decisões
referentes a tais tradições) dos Fariseus. Eles anunciavam às Boas Novas tanto a
judeus quanto a gentios (alguns segmentos dentro do Farisaísmo também faziam à
mesma coisa) e, principalmente, acreditavam que Yeshua era o Messias. Todas
essas crenças eram perfeitamente compatíveis com o Judaísmo como um todo.
AUTORIDADE DADA POR YESHUA
E eu te darei as
chaves do reino dos céus; e tudo o que ligares na terra será ligado nos céus, e
tudo o que desligares na terra será desligado nos céus. (Mateus 16:19)
A palavra “ligar” no
hebraico é empregada para proibir, enquanto “desligar” no hebraico é
empregada para permitir. Este verso não tem nada a ver com guerra espiritual,
como frequentemente é usado hoje em dia. Yeshua estava dando aos discípulos a
autoridade para fazer Halachá (decidir sobre formas de se cumprir a Lei). Em
outras palavras, as decisões teológicas que eles tomassem seriam aceitas nos
céus.
A Torah tem instruções de Elohim
para o Seu povo, mas em muitas ocasiões não menciona os detalhes. Como devemos
guardar o Shabat (exemplo: podemos dirigir?) ou como fazer a Pessach
(a “Páscoa” judaica)? Como tornar a carne pura para comer? Existem
centenas de perguntas como esta. Como resultado destas perguntas, os fariseus
(e outros) desenvolveram um sistema de tradições orais que eram bem elaboradas
sobre como fazer estas coisas.
Algumas de suas tradições (Halachá)
eram excelentes, algumas eram neutras, e outras eram tão excessivas que
violavam a letra e/ou o espírito dos mandamentos. Os do Caminho rejeitaram a Halachá
farisaica como autoridade final para fazer a sua própria Halachá. Eles
adotaram algumas, rejeitaram outras e fizeram suas próprias.
Eles fizeram isso porque Yeshua
deu a eles autoridade para fazê-lo (Mt. 16:19). Yeshua e os discípulos nem
sempre concordavam com a tradição oral (Mt. 15:1-11, Mt 12:1-8 etc.). E Yeshua
havia prometido dar a eles a Ruach HaKodesh (Espírito Santo) para
ajudá-los a tomar tais decisões (João 16:13, etc.)
OS LÍDERES ATRAVÉS DO TEMPO
Este segmento frutificou e muitos
judeus e gentios se tornaram parte dele (Atos 6.7). Dentre estes provavelmente
havia sacerdotes essênios, pois eles também criam na ressurreição (Atos 21.20).
A maioria dos primeiros crentes gentios eram pessoas tementes à YHWH que haviam
ouvido a Sha’ul pregar nas sinagogas (Atos 17.1-4, 18.4, etc.)
Por volta do ano 60 d.C. Ya’akov
(Tiago), irmão de Yeshua, era o líder dos Nazarenos e o havia sido
provavelmente por cerca de 20 anos ou mais. Em 62 d.C., de acordo com Josefo
(conhecido historiador judeu), Ya’akov foi preso pelo sacerdote chefe
(um saduceu) em uma época em que não havia governador romano em Jerusalém. O
sacerdote chefe o atirou de um pináculo do Templo e, como ele não morreu, o
espancou até a morte. Ya’akov era muito respeitado mesmo dentre aqueles
que não criam em Yeshua. Ele passava muito tempo no Templo em oração.
Quando o novo governador romano veio
a Jerusalém, a morte de Ya’akov foi protestada. Mas por quem?
Pelos fariseus! Eles teriam feito
isso se ele não fosse parte do Judaísmo, mas ao invés disso, fosse parte de uma
nova religião herética? Claro que não! A morte dele foi um duro golpe para a
comunidade dos Nazarenos porque ele havia sido o seu líder por muito tempo.
Ele foi substituído por um primo
de Yeshua – Shimon Ben Clofa – que foi escolhido pelos anciãos. Shimon
serviu a comunidade por cerca de 50 anos. Nos últimos 18 anos antes da
rebelião de Bar Kochba, os Nazarenos tiveram cerca de 13 líderes
diferentes (todos judeus). Depois de Bar Kochba, os crentes de origem
gentia passaram a liderar o grupo.
A REBELIÃO DOS JUDEUS
CONTRA ROMA
Em 66 d.C. ocorreu uma rebelião
contra Roma. Os crentes em Yeshua podem ou não terem se envolvido. Os
historiadores ainda não sabem isso ao certo. O que se sabe é que os crentes em
Yeshua receberam a revelação (uma fonte diz que foi diretamente de Yeshua e
outra de que foi através de um anjo) de que Jerusalém seria destruída e que
eles deveriam ir para Pella. Este foi o segundo aviso, o primeiro tendo
sido em Mateus 24.15-16. Pella era uma cidade na Decápolis
(atualmente é parte da Jordânia). Era uma cidade grega aproximadamente 24 km do
sul do Mar da Galiléia, bem próxima a Skitópolis, que atualmente é
chamada de Bet Shean.
Sabemos que Yeshua havia passado
por lá, pois era a principal estrada da Galiléia para Jerusalém se não
passarmos por Samaria. Sabemos ainda que Yeshua pregou na Decápolis, e que Pella
tinha uma população judaica considerável e que era a intercessão de grandes
rotas de comércio. Foi provavelmente naquela época que Ele pregou em Pella
e em 66 d.C. já havia por lá uma comunidade de Nazarenos.
Sabe-se que a maior parte dos
Nazarenos em Jerusalém, durante a revolta, conseguiu escapar para Pella.
Depois da guerra, muitos voltaram a Jerusalém. Alguns ficaram em Pella e
outros se mudaram para outros locais. Os Nazarenos continuaram a observar a
Torah, não necessariamente da forma farisaica.
O JUDAÍSMO APÓS O ANO 70
D.C.
Os Nazarenos nunca deixaram o
Judaísmo. Eles continuaram a observar a Torah, mas nem sempre da mesma forma
que os fariseus ou dos outros segmentos. Com a destruição de Jerusalém e do
Templo ocorrida em 70 d.C., o grupo dos Saduceus e dos Zelotes deixaram de
existir, assim como os Essênios (a comunidade de Qu’ram também foi destruída).
Os únicos grupos remanescentes do Judaísmo eram os Fariseus e os Nazarenos.
O líder dos Fariseus durante os
anos de 66-70 d.C. era Yochanan Ben Zakkai. Ele também percebeu que a
destruição de Jerusalém era iminente e escapou com muitos de seus discípulos. Para
isso ele teve que fingir seu próprio funeral e seus discípulos o levaram para
fora de Jerusalém.
Naquela época, os romanos
deixavam os judeus saírem. Porém, os zelotes não, pois precisavam de ajuda para
lutar contra Roma, então Yochanan pôs este plano em ação. Depois de sair
de Jerusalém, ele foi até o governador Vespasiano.
Conta a História que ele se
dirigiu a Vespasiano como “Imperador”, e antes que Vespasiano pudesse
corrigi-lo, um mensageiro entrou e disse que o Imperador havia morrido e que
Vespasiano era o novo Imperador (esta é uma versão abreviada da história). Yochanan
ganhou o favor de Vespasiano, que o deixou ir para Yavneh, cidade
litorânea, e lá começar uma escola de estudos da Torah.
AS SEMENTES DO JUDAÍSMO RABÍNICO
Antes de 70 d.C., havia muito
mais judeus e eles podiam se dar ao luxo de permitir diversos segmentos e
opiniões. Com o número de judeus drasticamente reduzido e o Templo destruído, Yochanan
percebeu que para sobrevivência do Judaísmo, eles precisariam se unir. A partir
de então começaram a codificar as tradições orais e a concordar em teologia e
doutrina. Isto levou muitos anos e houve muitas disputas, uma vez que existiam
muitas crenças em meio aos fariseus.
A maior delas foi talvez entre
Gamliel II e Rabi Akiva, no início do segundo século. Gamliel II achava que o Judaísmo
precisava apenas de algumas pequenas mudanças, enquanto Akiva considerava ser
necessário criar um sistema que desse todo o poder e autoridade aos rabinos.
Ele ganhou a disputa com Gamliel em uma batalha que foi cheia de malícia de
ambos os lados.
Rabi Akiva sistematizou o
Judaísmo por meio da sua Halachá, a qual indicava que a lei oral foi dada ao
mesmo tempo da Torah (Lei) de Moisés:
Quando o Santo
veio dar a Torá para Moshé, Ele disse sobre a ordem das Leituras, a Mishná, a Hagadá
e o Talmud, pois diz "E D'us falou todas essas palavras ..." (Shemot
20:1), até mesmo o que um aluno experiente perguntaria ao seu professor. O
Santo disse a ele “vá e ensine aos filhos de Israel ..." (Devarim 31:19).
Moshé respondeu: “Mestre do mundo, escreva para seus filhos!” D'us disse a ele,
“Eu quero dar a eles por escrito, mas foi revelado diante de mim que no futuro
as nações do mundo irão governá-los e tirarão deles. Então meus filhos serão
como as nações!” Então Moshé disse “dê-lhes as Leituras na forma escrita e a Hagadá,
Mishnah e o Talmud oralmente”. (Yalkut Shimoni 405:1)
Ele, portanto, deu à mente
judaica não apenas um novo campo para seu próprio emprego, mas, convencido da
imutabilidade da Sagrada Escritura e da necessidade de desenvolvimento no Judaísmo,
ele conseguiu reconciliar esses dois opostos por meio da sua halachá. Os frutos
desse trabalho resultaram no que hoje é o Judaísmo Ortodoxo.
OS FARISEUS E OS NAZARENOS
Os fariseus estavam sediados em Yavneh
e os do Caminho (Nazarenos) em Pella. A cisma de antes era apenas uma
discussão interna. Mas após a destruição de Jerusalém, estavam se distanciando
de forma considerável e uma ruptura total era inevitável. Os rabinos de Akiva
começaram a trazer novas regras e teologia. Isto era em parte necessário para
que tivessem o Judaísmo sem o Templo e os sacrifícios de sangue. Antes do
Templo ser destruído, a Escola Farisaica de Shammai (com quem Yeshua tinha
grandes discordâncias) predominava. Em Yavneh eles decidiram que, dali
em diante, a Escola de Hillel predominaria. Os sacrifícios foram substituídos
por orações e atos de caridade.
É claro que nem todas as decisões
deles foram ruins. Eles tinham uma tarefa difícil, havia conflitos de poder e
muitas decisões foram problemáticas. Os do Caminho que anteriormente eram
basicamente tolerados (embora, é claro, houvesse algum conflito) agora eram
vistos como uma grande ameaça à unidade e sobrevivência do Judaísmo, porque
eles não aceitavam a autoridade final dos rabinos fariseus. Além disto, o
grande número de gentios que estavam se juntando aos do Caminho era considerado
problemático.
Havia muitas regras a se
considerar. Sem o Templo, como se deve tocar o shofar no Yom Kippur
e em Yom Teruah? Antes isto só era feito no Templo. Leva-se o luvav
para fora de Jerusalém no Sukkot? Havia centenas de decisões iguais a
estas a serem feitas e os fariseus queriam que elas fossem feitas para todos
dentro do Judaísmo.
A CRESCENTE SEPARAÇÃO
Aproximadamente em nas décadas de
80/90 d.C., em muitos lugares os do Caminho (Nazarenos) ainda estavam adorando
a Elohim nas sinagogas, juntamente com os fariseus, e novamente eram
considerados uma ameaça. Para remediar a situação, os fariseus adicionaram uma
“bênção” na Amidah (oração central da liturgia judaica, na
tradição rabínica). Foi inserida como a de número 12 e foi chamada de Birkot
HaMinim. Não era universalmente praticada em todas as sinagogas, mas era
uma “bênção” contra os minim e dizia algo do tipo:
Para os apóstatas
(meshumaddim) que não haja esperança e desenraizem o reino da arrogância
(malkhut zadom), rapidamente e em nossos dias. Que os nazarenos (ha-naẓarim/noṣrim/notzrim)
e os sectários (minim) morram como em um momento. Que eles sejam apagados do
livro da vida, e não sejam escritos junto com os justos. Bendito sejas Tu,
Eterno, que quebra os inimigos e subjuga os iníquos
Ora, os do Caminho obedeciam sim
à Torah, só que não à maneira farisaica. Esta “bênção” foi inserida para
separar os Nazarenos do Judaísmo Rabínico.
Ao contrário do restante da Amidah,
que era feita silenciosamente e de forma bem suave, esta “bênção” tinha
que ser recitada em alto e bom som. Se você fosse nazareno, as suas opções seriam
deixar a sinagoga ou amaldiçoar a si mesmo. Isto, é claro, separou os nazarenos
dos fariseus ainda mais, mas até certo ponto ainda havia diálogo entre eles até
a metade do II século e alguns deles podem ser lidos no Talmud.
O INÍCIO DO ANTISSEMITISMO
DE ROMA
O Judaísmo era uma religião
permitida por Roma. Os Romanos permitiam que eles não trabalhassem no Shabat
e os eximiam de fazerem sacrifícios a César (em troca eles faziam sacrifícios “por
César”). Os nazarenos, é claro, estavam entre os judeus.
Os romanos notaram a expulsão dos
nazarenos das sinagogas com grande suspeita. Com frequência os privilégios eram
removidos. E quando isso acontecia, os nazarenos tinham que se esconder ou
aceitar punições. Roma nunca aceitaria uma nova religião.
Alguns destes crentes gentios
tentaram convencer os romanos de que eram os sucessores do Judaísmo e que, por
isso, deveriam ter os mesmos privilégios que os judeus; eles se diziam os
verdadeiros herdeiros do Judaísmo. Foi a partir desse ponto que começaram a
surgir (embora consolidados com mais força na época de Constantino) as
primeiras sementes da satânica Teologia da Substituição e do antissemitismo
entre os seguidores de Yeshua.
A CARTADA FINAL DE RABI
AKIVA
Em 135 DC, iniciou a rebelião de Bar
Kochba contra Roma. Rabi Akiva declarou que Bar Kochba era o messias
(alguns dizem que isto foi para fazer a cisão final com os do Caminho/Nazarenos,
pois eles lutariam sob a bandeira de um messias diferente). Muitos fariseus
também não aceitavam Bar Kochba como messias, mas ainda sim muitos
lutaram (uma vez que não tinham Yeshua como Messias).
Durante aquele período, os
rabinos declararam que a leitura de qualquer livro minim (incluindo o
que é conhecido hoje como “Novo Testamento”) tornava uma pessoa impura e
que os livros deveriam ser queimados. Akiva disse que aqueles que lessem os
livros minim não tomariam parte no mundo vindouro (apesar de contradizer
a própria Mishnah). Até mesmo os rolos da Torah que fossem escritos
pelos minim eram considerados dignos de serem queimados. A separação
estava concluída.
Este estudo foi
baseado em pesquisa de Ray Pritz, da Universidade Hebraica de Jerusalém
Texto corrigido e adaptado
por Francisco Adriano Germano
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