INTRODUÇÃO
É provável que não haja
festividade mais recheada de tradições farisaicas do que a festividade de Yom
Teruá, chamada erroneamente pelo judaísmo rabínico de nosso tempo, o qual
se tornou herdeiro da tradição dos antigos p’rushim (fariseus), de “Rosh
HaShaná”.
Muitos sabem que, de fato, a Torá
jamais determina que Yom Teruá seja entendido como “Rosh HaShaná”,
e que a Torá é bastante clara sobre o princípio do ano bíblico ser na
Primavera.
Todavia, ainda assim, a
maioria ainda comemora Yom Teruá com base nas tradições rabínicas.
Nelas, Yom Teruá é tido como um dia misterioso, recheado de conceitos
místicos, e denominado de princípio de um período relativamente pesado, chamado
de “Yamim Noraim”, ou “Dias Temíveis” - que seriam supostamente
os dias que iriam de Yom Teruá a Yom haKipurim, isto é, do
primeiro ao décimo dia do sétimo mês.
Sendo assim, convém aqui fazer
uma análise puramente bíblica desta importante solenidade, para que se possa
celebrar o moed (solenidade) de forma plenamente bíblica.
O QUE DIZ A TORÁ
O início deste estudo se dará
pela passagem da Torá onde Yom Teruá é determinado:
וַיְדַבֵּ֥ר יְהֹוָ֖ה אֶל־מֹשֶׁ֥ה לֵּאמֹֽר׃
דַּבֵּ֛ר אֶל־בְּנֵ֥י יִשְׂרָאֵ֖ל לֵאמֹ֑ר בַּחֹ֨דֶשׁ הַשְּׁבִיעִ֜י
בְּאֶחָ֣ד לַחֹ֗דֶשׁ יִֽהְיֶ֤ה לָכֶם֙ שַׁבָּת֔וֹן זִכְר֥וֹן
תְּרוּעָ֖ה מִקְרָא־קֹֽדֶשׁ: כָּל־מְלֶ֥אכֶת עֲבֹדָ֖ה לֹ֣א תַֽעֲשׂ֑וּ וְהִקְרַבְתֶּ֥ם אִשֶּׁ֖ה כָּל־מְלֶ֥אכֶת עֲבֹדָ֖ה לֹ֣א תַֽעֲשׂ֑וּ
וְהִקְרַבְתֶּ֥ם אִשֶּׁ֖ה
DABER EL-BENEI
ISRAEL LEMOR BACHODESH HASHEVI'I BE'ECHAD LACHODESH YIHIE LACHEM SHABATON
ZICH'RON TERUAH MICRÁ KODESH; KOL-MECHELET AVODÁ LO TA'ASSU VEHIKRAVTEM ISHE
L'YHWH.
Fala aos filhos de
Israel, dizendo: No mês sétimo, ao primeiro do mês, tereis descanso, memorial
com Teruá, santa convocação. Nenhum trabalho servil fareis, mas oferecereis
oferta queimada a YHWH. (Vayicrá/Levítico 23.23-25)
Algumas palavras-chaves aparecem
na menção desta solenidade. A primeira a ser observada é a palavra “Shabaton”,
e a proibição de “mechelet avodá”, isto é, trabalho servil.
Isso significa que esta
solenidade não é um Shabat completo (chamado biblicamente de Shabat
Shabaton), mas sim um dia em que não se exerce ou se usufrui de atividade
servil (trabalho assalariado).
Posteriormente, têm-se os termos “zich’ron”,
comumente traduzido como “memorial”, e “teruá”, que é indicado
como o objetivo da solenidade. Os contextos de “teruá”, utilizados para se
referir ao júbilo do povo, apontam de forma bastante interessante à ideia de
livramento. Parece ser a certeza de que, estando Elohim com o povo, tudo está
bem. O povo está protegido de seus inimigos, e confia no Seu Adon (Senhor).
Iyov/Jó também aponta para
um contexto particularmente relevante para os seguidores de Yeshua: A alegria
do livramento das consequências do pecado. Ou seja, a alegria também pelo
livramento do juízo, o que será particularmente relevante mais adiante quando
for mencionada a conexão com o Dia de YHWH.
Dessa forma, Yom Teruá aponta,
em princípio, na direção de uma celebração pelo fato do povo de Israel estar
sob a proteção e o cuidado de YHWH, sendo por Ele redimido do juízo.
ASPECTOS BÍBLICOS DE YOM
TERUÁ
Além da compreensão do sentido de
“teruá”, existem algumas passagens bíblicas que também indicam que outros
elementos adicionais compõem a temática de Yom Teruá. A seguir, uma
análise de tais passagens.
Fim da Colheita de Verão
Um texto particularmente
relevante encontra-se em Amós 8:1-5, que diz:
YHWH assim me fez ver:
E eis aqui um cesto de frutos do verão. E disse: Que vês, Amós? E eu disse: Um
cesto de frutos do verão. Então YHWH me disse: Chegou o fim sobre o meu povo
Israel; nunca mais passarei por ele. Mas os cânticos do templo naquele dia
serão gemidos, diz YHWH; multiplicar-se-ão os cadáveres; em todos os lugares
serão lançados fora em silêncio. Ouvi isto, vós que anelais o abatimento do
necessitado; e destruís os miseráveis da terra, dizendo: Quando passará o Chodesh,
para vendermos o grão, e o Shabat, para abrirmos os celeiros de trigo,
diminuindo o efa, e aumentando o siclo, e procedendo dolosamente com balanças
enganosas.
Parte do texto acima é usado por
alguns para defender que o Rosh Chodesh, isto é, o princípio do mês,
seria também um dia semelhante ao Shabat. Porém, é bastante claro pelo
contexto que na realidade a referência não é a qualquer Rosh Chodesh -
visto que a Torá jamais especifica que Rosh Chodesh seja um dia de Shabaton
- mas sim o Rosh Chodesh do sétimo mês, que é justamente Yom Teruá!
Observe a referência aos cânticos
do Templo, bem como o contraste disso com uma situação de silêncio, o que seria
a antítese de “teruá”.
Além disso, é bastante claro o
fato de YHWH se referir ao cesto dos frutos de verão. A colheita de verão em
Israel dura exatamente até a época do sétimo mês, que é quando começa o outono.
Pelo calendário bíblico, Yom Teruá cai exatamente no início de outono, e
é marcado pelo cessar dos frutos de verão - imagem essa que é utilizada por
YHWH na visão concedida a Amós.
O interessante é que isso também
nos indica um dos principais motivos de regozijo de Yom Teruá: O fato de
YHWH tê-los abençoado com a colheita de verão. Numa sociedade agrária, a
colheita de verão seria exatamente um momento de deleite, por causa da
abundância de frutos.
O Dia de YHWH
Outro elemento fundamental que
diz respeito à Yom Teruá é a temática do Dia de YHWH, isto é, o dia de
Seu retorno à terra. Isso aparece claramente em Tsefaniyah (Sofonias),
que afirma:
O grande dia de
YHWH [yom-YHWH haGadol] está perto, sim, está perto, e se apressa muito; amarga
é a voz do dia de YHWH; clamará ali o poderoso. Aquele dia será um dia de
indignação, dia de tribulação e de angústia, dia de alvoroço e de assolação,
dia de trevas e de escuridão, dia de nuvens e de densas trevas; Dia de trombeta
e de alarido [yom shofar uteruá] contra as cidades fortificadas e contra as
torres altas. (Tsefaniyah/Sofonias 1.14-16)
O grande dia de YHWH é chamado
também de “Yom Shofar uTeruá”, literalmente, dia de shofar e de teruá.
Isto é, um dia em que há toque do shofar, e há teruá. Certamente que essa
referência se deve ao fato de que o chodesh é um dia em que o toque de shofar é
ordenado. E o sétimo chodesh é justamente o dia de teruá.
Neste contexto, “teruá”
parece se referir aos brados dos exércitos celestiais de YHWH que, em Seu
retorno, causará destruição dos iníquos e dos inimigos de Israel. Mas, é
possível também que “teruá” se refira ainda à alegria dos salvos, que
saberão que chegou o fim da opressão e o início do Reinado de Yeshua HaMashiach.
Dentro desse contexto, essa
passagem é análoga a algumas passagens neotestamentárias, que podem ser vistas a
seguir:
Porque o nosso
próprio Adon descerá do céu com alarido, e com voz de arcanjo, e com a trombeta
de Elohim; e os que morreram no Mashiach ressuscitarão primeiro. (Tessalonissayah
Alef/1 Tessalonicenses 4.16)
Num momento, em um
abrir e fechar de olhos, ante a última trombeta; porque a trombeta soará, e os
mortos ressuscitarão incorruptíveis, e nós seremos transformados. (Curintayah
Alef/1 Coríntios 15.52)
Nestas duas a referência é
bastante clara. O grande dia de YHWH será o dia em que Ele regressará, e
será composto não apenas pelo juízo aos iníquos, mas também pela ressurreição
dos santos. Nisto, há júbilo para os salvos em Yeshua, que
experimentarão livramento da morte e a segurança de habitarem com Yeshua
eternamente.
Eu fui arrebatado
em espírito no primeiro dia do sétimo [b’yoma d’chad b’shaba], e ouvi por
detrás de mim uma grande voz, como de trombeta. (Guilyana/Apocalipse 1.10)
Há no meio cristão um
entendimento equivocado neste trecho, gerado pelo fato de que “shaba” no
aramaico, que significa literalmente sete, frequentemente se refere à semana.
Sendo assim, é compreendido que Yochanan (João) teve sua visão no primeiro dia
da semana.
Todavia, observe a continuação
deste passuk (versículo) onde há menção à grande voz de trombeta. Essa é uma
temática bastante específica do primeiro dia do sétimo mês, isto é, de Yom
Teruá.
Não à toa, Yochanan (João) foi
tomado em visão em Yom Teruá, pois Guilyana (Apocalipse) descreve
exatamente os acontecimentos que gravitam em torno do Grande Dia de YHWH.
EXEMPLO DE CELEBRAÇÃO DE
YOM TERUÁ
Felizmente, Yom Teruá
apresenta uma rara descrição bastante detalhada de uma celebração, nos tempos
de Ezra (Esdras) e Nehemiyah (Neemias), que deve ser lida cuidadosamente.
É importante que o leitor se
atente para cada detalhe descrito, pois é como as Escrituras descrevem a
celebração da solenidade.
E chegado o sétimo mês, e
estando os filhos de Israel nas suas cidades, todo o povo se ajuntou como um só
homem, na praça, diante da porta das águas; e disseram a Ezra, o escriba, que
trouxesse o livro da Torá de Moshe, que YHWH tinha ordenado a Israel. E Ezra, o
cohen, trouxe a Torá perante a congregação, tanto de homens como de mulheres, e
todos os que podiam ouvir com entendimento, no primeiro dia do sétimo mês. E
leu no livro diante da praça, que está diante da porta das águas, desde a alva
até ao meio-dia, perante homens e mulheres, e os que podiam entender; e os
ouvidos de todo o povo estavam atentos ao livro da Torá. E Ezra, o escriba,
estava sobre um púlpito de madeira, que fizeram para aquele fim; e estava em pé
junto a ele, à sua mão direita, Matitiyah, Shemah, Anayah, Uriyah, Chilkiyah e
Ma'asseyah; e à sua mão esquerda, Pedayah, Mishael, Malkiyah, Chashum,
Chashbadana, Zechariyah e Meshulam. E Ezra abriu o livro perante a vista de todo
o povo; porque estava acima de todo o povo; e, abrindo-o ele, todo o povo se
pôs em pé. E Ezra louvou a YHWH, o grande Elohim; e todo o povo respondeu:
Amen, Amen! levantando as suas mãos; e inclinaram suas cabeças, e adoraram a
YHWH, com os rostos em terra. E Yeshua, Bani, Sheraviyah, Yamin, Akuv, Shabtai,
Hodiyah, Ma'asseyah, Kelitah, Azariyah, Yozavad, Chanan, Pelayah, e os levi'im
ensinavam o povo na Torá; e o povo estava no seu lugar. E leram no livro, na
Torá de Elohim; e declarando, e explicando o sentido, faziam que, lendo, se
entendesse. E Nehemiyah, que era o governador, e o cohen Ezra, o escriba, e os
levi'im que ensinavam ao povo, disseram a todo o povo: Este dia é consagrado a
YHWH vosso Elohim, então não vos lamenteis, nem choreis. Porque todo o povo
chorava, ouvindo as palavras da Torá. Disse-lhes mais: Ide, comei as gorduras,
e bebei as doçuras, e enviai porções aos que não têm nada preparado para si;
porque este dia é consagrado ao nosso Adon; portanto não vos entristeçais;
porque a alegria de YHWH é a vossa força. E os levi'im fizeram calar a todo o
povo, dizendo: Calai-vos; porque este dia é santo; por isso não vos
entristeçais. Então todo o povo se foi a comer, a beber, a enviar porções e a
fazer grande regozijo; porque entenderam as palavras que lhes fizeram saber. (Nehemiyah/Neemias
8:1-12)
Evidentemente que Nehemiyah
(Neemias) não traz um script para ser seguido à risca, mas certamente que nos
dá uma boa noção de como deve ser a celebração de Yom Teruá.
Os seguintes elementos são
claros:
• Leitura e estudo da Torá.
• Louvor e adoração a YHWH.
• Banquetes de comidas e
bebidas agradáveis ao paladar.
• Fundamentalmente, é um dia
de alegria, e não de pranto ou tristeza.
TOQUES DE SHOFAR E TROMBETA
E AS SOLENIDADES
É importante ficar claro para o leitor
que existem toques de shofar e de trombeta que não são específicos de Yom
Teruá, mas que se faziam presentes em toda solenidade bíblica, bem como em
outras datas importantes.
Duas passagens devem ser
analisadas:
Semelhantemente,
no dia da vossa alegria e nas vossas solenidades, e nos princípios de vossos
meses, também tocareis as trombetas [chatsotsrot] sobre os vossos holocaustos,
sobre os vossos sacrifícios pacíficos, e vos serão por memorial perante vosso
Elohim: Eu sou YHWH vosso Elohim. Bamidbar/Números 10.10
O texto supracitado afirma que em
datas como os moadim e os chodashim, sobre os sacrifícios do Mikdash
(Santuário) eram tocadas as chatsotsrot, isto é, as trombetas de prata.
Vale ressaltar que não eram quaisquer trombetas, e sim as duas trombetas de
prata do Mikdash (Santuário), à hora dos sacrifícios.
Evidentemente, sem o Mikdash
(Santuário) e sem as chatsotsrot (trombetas) essa mitsvá
(mandamento) é impossível de ser cumprida. Até é possível que se faça algo
simbólico referente a isso, todavia não se pode considerar como cumprimento da mitsvá
(mandamento).
A segunda passagem analisada é a
passagem abaixo:
Tocai a shofar no
chodesh [tiku vachodesh shofar], no tempo apontado da nossa festa.
(Tehilim/Salmos 81:3)
Observe que essa passagem afirma
que havia toque de shofar no Chodesh, isto é, quando havia mudança de mês. Isto
se aplica a Yom Teruá e, portanto, no princípio de Yom Teruá, a
shofar deve ser tocada para anunciar o início do sétimo mês.
Todavia, conforme observado
anteriormente, esta passagem se refere a chodashim (meses) de um modo
geral, e não especificamente a Yom Teruá.
Deve haver toque de shofar em
Yom Teruá?
Resposta: Deve haver o toque
especificado como anúncio do Rosh Chodesh (Princípio do Mês). Mas, se a
pergunta se refere a um toque específico para Yom Teruá, durante sua
celebração, como é feito no Farisaísmo, a resposta é não necessariamente. Como
visto o termo “teruá” não obriga que haja toque de shofar ou de
trombeta, uma vez que pode se referir a vários instrumentos ou mesmo a vozes
humanas. O sentido de “teruá” é o de uma comoção, muito mais do que de
um instrumento específico.
Todavia, certamente que nos
tempos bíblicos, a shofar era instrumento bastante comum, e certamente estava
presente nas celebrações de Yom Teruá, assim como a trombeta, o címbalo,
a harpa e outros instrumentos. Sendo assim, é pertinente o uso da shofar se
desejado, embora não haja obrigatoriedade além daquele referente ao Chodesh.
CONCLUSÕES
O seguinte pode ser concluído
sobre Yom Teruá, a partir da análise das Escrituras:
- É fundamentalmente um
memorial de júbilo (zich’ron teruá) e, portanto é uma data de festividade
bastante alegre.
- Além do toque típico do
Chodesh, não há obrigatoriedade de uso de shofar, embora seja possível fazê-lo.
- É uma data em que se
fazem banquetes de alimentos que sejam agradáveis ao paladar.
- Teruá também simboliza a
algazarra dos exércitos do Eterno, bem como o júbilo dos israelitas pela
vitória vindoura no Dia de YHWH. O Dia de YHWH marca do dia do retorno de
Yeshua.
- As tradições rabínicas
não apenas distorcem o significado de Yom Teruá, como ainda transgridam as
Escrituras.
- Yom Teruá também
representa a alegria pela colheita de verão, que se encerra justamente nessa
data.
- O principal motivo de
comemoração de Yom Teruá é o livramento que os israelitas têm por terem YHWH
por Elohim.
- O livramento é tanto de
natureza militar, como também do juízo, em virtude da salvação do justo, o que
é particularmente relevante para os seguidores de Yeshua.
Sha'ul Bentsion
Texto corrigido e adaptado por Francisco Adriano Germano
Comentários
Postar um comentário