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CHANUKÁ - VERDADE, MENTIRAS, TRAIÇÃO E RESTAURAÇÃO (PARTE II)

 


Macabim Beit e Sukot

 

Mas então, por que os Macabim (Macabeus) decidiram fazer uma festa de oito dias? Macabim Beit (2 Macabeus) dá o motivo, e não tem absolutamente nada a ver com um suposto óleo mágico:

 

Durante oito dias, fizeram uma festa semelhante à de Sukot, relembrando que, pouco tempo antes, haviam passado essa festa vagueando pelos montes e cavernas, como animais. Por isso, trazendo hastes e ramos verdes e folhas de palmeiras, entoavam hinos Àquele que lhes estava dando a alegria de purificar o seu lugar santo. Depois, com um decreto público, assumido por todos, prescreveram que toda a nação dos judeus celebraria estes dias de festa cada ano. (Macabim Beit/2 Macabeus 10:6-8)_

 

O motivo fica bastante claro: Os Macabim (Macabeus) foram impedidos de celebrarem Sukot (Tabernáculos) + Shemini Atseret (Oitavo dia) por causa da perseguição dos selêucidas. Sendo assim, decidiram celebrarem-na logo que se tornou possível, quando por ocasião da purificação do Beit HaMikdash (Templo).

 

Ou seja, a celebração de Chanuká original dos Macabim (Macabeus) foi bastante semelhante à de Shlomo (Salomão): aproveitaram a ocasião para fazerem a celebração de uma espécie de “Sukot Sheni” juntamente com a dedicação do altar!

 

O princípio utilizado pelos Macabim (Macabeus) para a celebração de um “Sukot Sheni” (Segundo Sukot) foi baseado no fato de que a Torá prevê a possibilidade da celebração do chamado Pessach Sheni, isto é, uma segunda celebração da “Páscoa israelita” para aqueles que não puderam estar presentes na primeira por motivos alheios à sua vontade:

 

Fala aos filhos de Israel, dizendo: Quando alguém entre vós, ou entre as vossas gerações, for imundo por tocar corpo morto, ou achar-se em jornada longe de vós, contudo ainda celebrará o Pessach a YHWH. No mês segundo, no dia catorze à tarde, a celebrarão; com pães ázimos e ervas amargas a comerão. (Bamidbar/Números 9:10-11)

 

Inicialmente, a Torá havia previsto a celebração unicamente do Pessach, isto é, do sacrifício ocorrido à véspera do décimo-quinto dia. Todavia, nos tempos de Hizkiyahu (Ezequias), o povo de Israel celebrou também no segundo mês a festa de Matsot (pães ázimos):

 

E ajuntou-se em Yerushalayim muito povo, para celebrar a festa dos pães ázimos, no segundo mês; uma congregação mui grande. (Divrei HaYamim Beit/2 Crônicas 30:13)

 

E de fato Elohim se agradou disso. Estabeleceu-se, portanto, um precedente saudável: Quando somos impedidos de realizarmos uma festa a Elohim, é melhor celebrá-la de forma tardia, mesmo que fora do seu tempo, do que nada fazer.

 

Foi justamente partindo dessa premissa que os Macabim (Macabeus) resolveram fazer uma espécie de Sukot Sheni, pois não deixaram de realizar a festa por vontade própria, mas sim por motivos de perseguição por parte dos selêucidas.

 

Aproveitaram a ocasião para fazerem a festa de Chanukat HaMizbeach (dedicação do altar), e, como forma de comemorarem a libertação do paganismo, da assimilação, e das forças que desejavam impedi-los de observarem as mitsvot (mandamentos) de Elohim, recomendaram que as gerações futuras repetissem essa celebração anualmente.

 

O Milagre do Fogo do Altar

 

O único outro elemento que é recordado em Macabim Beit (2 Macabeus) acerca deste episódio também nada tem a ver com o suposto milagre do óleo:

 

Estando nós para celebrar a purificação do Beit HaMikdash, no dia vinte e cinco do mês de Kislev, julgamos necessário informar-vos a respeito, a fim de que vós também celebreis essa festa das Tendas. Celebrai também a memória do fogo que nos foi dado quando Nehemiyah, tendo reedificado o templo e o altar, ofereceu sacrifícios. De fato, quando nossos pais foram levados cativos para a Pérsia, os sacerdotes de então, tementes a Elohim, tomaram do fogo do altar secretamente e o ocultaram na cavidade de um poço desativado. Ali o conservaram em segurança, de tal maneira que ninguém ficou sabendo do lugar. Tendo-se passado muitos anos, quando pareceu bem a Elohim, Nehemiyah, enviado pelo rei da Pérsia, mandou que procurassem o fogo os descendentes daqueles sacerdotes que o haviam escondido. Como nos contaram, eles não encontraram o fogo, mas um líquido espesso. Nehemiyah mandou-os tirar um pouco dessa água e trazê-la. Colocados os sacrifícios sobre o altar, Nehemiyah mandou que os sacerdotes aspergissem, com aquela água, a lenha e o que estava sobre ela. Feito isso, e chegado o momento em que o sol, antes encoberto por nuvens, tornou a brilhar, acendeu-se uma grande chama, a ponto de todos ficarem maravilhados. (Macabim Beit/2 Macabeus 1:18-22)

 

O texto faz alusão ao fato de que nos tempos da reconstrução do Beit HaMikdash (Templo), ainda na época do regresso com Ezra (Esdras) do primeiro exílio, Nehemyiah (Neemias) teria encontrado algum tipo de óleo e, ele havia acendido ao ser posto sobre o altar. Aparentemente, os filhos de Israel tinham por hábito, durante a festa de Sukot, relembrarem esse episódio.

 

Mesmo assim, o evento não tem qualquer relação com o milagre do óleo da Menorá relatado pelos p'rushim (fariseus.) A própria Bíblia nos relata que era comum que Elohim enviasse fogo dos céus para consumir os sacrifícios do Mizbeach (altar), conforme vemos na Tanach (Primeiro Testamento):

 

Porque o fogo saiu de diante de YHWH, e consumiu o holocausto e a gordura, sobre o altar; o que vendo todo o povo, jubilaram e caíram sobre as suas faces. (Vayicrá/Levítico 9:24)

 

E acabando Shlomo de orar, desceu o fogo do céu, e consumiu o holocausto e os sacrifícios; e a glória de YHWH encheu a casa. (Divrei HaYamim Beit/2 Crônicas 7:1)

 

Podemos perceber, portanto, que o milagre ocorrido com Nehemiyah (Neemias) a que Macabim Beit (2 Macabeus) se refere nada mais era do que a compreensão de que a presença de YHWH havia regressado ao Beit HaMikdash (Templo) e que havia aceitado os sacrifícios ofertados. Ou seja, não havia aqui também nada de especial, e certamente nenhum evento envolvendo o óleo da Menorá.

 

O Testemunho de Josefo

 

Além dos livros dos Macabim (Macabeus), um outro testemunho histórico nos demonstra que o milagre de Chanuká, conforme narrado pelos fariseus, jamais existiu. É o testemunho de Flavio Josefo, historiador judeu do primeiro século da era comum:

 

E então Yehudá e seus companheiros celebraram o festival da restauração dos sacrifícios do Templo por oito dias, e não omitiram qualquer tipo de prazer, mas todos banquetearam sobre ricos e esplêndidos sacrifícios. E honraram a Elohim, e se deleitaram com salmos de louvor e tocaram harpas. De fato, ficaram tão felizes com o reavivamento de seus costumes e, depois de um longo período, tendo inesperadamente readquirido o direito à adoração, tornaram lei para a sua posteridade que observassem um festival celebrando a restauração da adoração no Templo por oito dias. E desde aquele tempo até este, nós o celebramos, o qual chamamos de Festival das Luzes porque, eu imagino, além das nossas esperanças esse direito foi trazido à luz, e esse nome foi posto sobre o festival. (Antiguidades 12:7:7)

 

Josefo não apenas não faz qualquer menção ao suposto milagre do óleo da Menorá, como ainda confirma os motivos dados nos livros dos Macabim (Macabeus), e ainda faz uma afirmação importante: alguns chamavam o festival de Chanuká de “Festival das Luzes”, e ele não sabia o porquê.

 

É importante que o leitor compreenda que Flavio Josefo não era um historiador qualquer. Josefo era um parush (fariseu), e de família de cohanim (sacerdotes) de relativo status e respeito em sua sociedade. Isso fica bem claro em seu relato autobiográfico conhecido como “A Vida de Flavio Josefo”, já no primeiro parágrafo.

 

Os relatos de Josefo sobre os eventos do povo de Israel, sobre a Torá, e sobre os costumes e festas do povo, são riquíssimos em detalhes. Josefo não era um leigo, e sim uma pessoa com bastante conhecimento sobre o Judaísmo, suas seitas e tradições. E por que é importante ter isso em mente?

 

Porque se o milagre do óleo da Menorá tivesse de fato ocorrido, e fosse esse o motivo pelo qual a festa era chamada por alguns de “Festival das Luzes”, certamente Josefo conheceria a razão. E certamente não deixaria um milagre de tão grande importância e o motivo central da festa, segundo os p'rushim (fariseus) de fora de seu detalhado relato sobre os eventos da revolta dos Macabim (Macabeus), da restauração do Beit HaMikdash (Templo) e subsequente origem da festa.

 

O fato de Josefo não saber a razão pela qual a festa era chamada (certamente no círculo farisaico) de “Festival das Luzes” também indica que, além de não ter nada a ver com o suposto milagre, esse não era um costume unânime. Veremos mais adiante a razão pela qual a festa adquiriu também essa nomenclatura posterior.

 

Mas Josefo não é o único a citar os eventos de Chanuká, e omitir qualquer menção ao suposto milagre. Vejamos ainda alguns documentos dos próprios p'rushim (fariseus). A Meguilat Ta'anit, a fonte rabínica mais antiga a citar os eventos que envolvem a celebração de Chanuká diz:

 

No terceiro dia de Kislev as insígnias foram removidas do Tempo... no vigésimo quinto dia deste, o dia da dedicação oito dias, é proibido prantear. (Meguilat Ta'anit, século 1 d. C.)

 

Podemos perceber que na Meguilat Ta'anit também não há qualquer menção ao óleo milagroso. Além disso, no scholion (comentário) da Meguilat Ta'anit, lemos o seguinte:

 

Por que eles fizeram essa dedicação de oito dias? Porque nos dias dos reis gregos, os Hasmoneus entraram no Templo e construíram um altar e o cobriram com revestimento e prepararam os vasos do Templo, e levaram oito dias trabalhando nele. (Scholion -Meguilat Ta'anit, séculos 1-2 DC)

 

Ou seja, não apenas esse comentário farisaico primitivo não menciona o milagre do óleo de Chanuká, como ainda contradiz o seu relato, claramente atribuindo os 8 dias à preparação do Beit HaMikdash (Templo) que, provavelmente, ocorreu em meio às festividades.

 

Continua na Parte III

 

Por Sha'ul Bentsion

 

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