Introdução
Talvez você, leitor, se surpreenda,
mas este texto não se trata de Batalha Espiritual. Também não ensinará técnicas
de exorcismo e tampouco falará de estratégias contra espíritos malignos. Também
não falará sobre orações especiais. Mas como, então, explicar o título?
A resposta está na palavra diabo, que
significa muito mais do que se imagina. Explico:
A palavra diabo é derivada do grego diabolos
(διάβολος). No grego, etimologicamente, o termo vem do verbo diaballo,
que é composto do prefixo dia, que significa “atravessar” e ballos,
que significa “lançar”. Dependendo do contexto, diaballo pode
significar lançar algo, causar confusão, espalhar informações, derrubar ou
dividir.
Geralmente, o termo diabolos é
traduzido de três formas, de acordo com o que se deseja expressar: caluniador,
destruidor ou acusador.
Sendo um Diabo
Observe agora o texto de três passagens
de Sha’ul (Paulo), e como a palavra é utilizada:
Da mesma
sorte as esposas sejam honestas, não maldizentes [grego: diabolous / aramaico:
ekaln kartsa], sóbrias e fiéis em tudo. (Timoteus Alef/1 Timóteo 3:11)
Porque
haverá homens amantes de si mesmos, avarentos, presunçosos, soberbos,
blasfemos, desobedientes a pais e mães, ingratos, profanos, sem afeto natural,
irreconciliáveis, caluniadores [grego: diaboloi / aramaico: aklai kartsa],
incontinentes, cruéis, sem amor para com os bons […] (Timoteus Beit/2 Timóteo
3:2-3)
As
mulheres idosas, semelhantemente, que sejam sérias no seu viver, como convém a
santas, não caluniadoras [diabolous / aramaico: ekaln kartsa], não dadas a
muito vinho, mestras no bem. (Tito 2:3)
Nos textos acima, Sha’ul
(Paulo) chama a homens e mulheres pelo mesmo termo! Abra sua Bíblia, e releia
os versículos dentro do contexto, e veja o que eles se referem.
Em todos esses trechos, a expressão
aramaica é composta das raízes akal e kartsa que significam,
respectivamente, “devorar ou destruir” e “acusar”. Em outras
palavras, trata-se daquele que acusa para devorar/destruir, isto é, para ferir
o próximo. É exatamente essa a característica de quem é um diabolos
(diabo) para com o próximo.
A Língua Destruidora
Isso fica ainda mais claro quando
recorremos às Escrituras do Tanach (Primeiro Testamento), onde lemos o
seguinte:
Quem,
YHWH, habitará na tua tenda? quem morará no teu santo monte? Aquele que anda
irrepreensivelmente e pratica a justiça, e do coração fala a verdade; que não
difama [ragal] com a sua língua, nem faz o mal [ra'á] ao seu próximo, nem
contra ele aceita nenhuma afronta. (Tehilim/Salmos 15:1-3)
Embora fazer o mal fisicamente ao
próximo seja algo ruim, observe que aqui o contexto se refere à fala. No
hebraico, a continuidade de ideias fica bem explícita: O coração que fala a
verdade, a língua que não difama, e que não faz o mal, e aquele não aceita
afrontas.
A raiz hebraica da palavra rá
(de onde se deriva ra’á) significa, mais literalmente, destruição. Ou seja, a lashon
hará, a língua má por assim dizer, é na realidade a língua destruidora.
Já o verbo ragal (רגל), aqui utilizado para se referir à
difamação, vem de reguel, que significa pé ou pisadura. E é utilizado
também para espionar:
Depois
Moshe mandou espiar [le'raguel] a Jazer, e tomaram as suas aldeias e expulsaram
os amorreus que ali estavam. (Números/Números 21:32)
Ou seja, quem é a pessoa que não
habitará com YHWH, pelo contexto do salmo? É aquela que pisa na reputação de
alguém; aquela que vai atrás de saber detalhes da vida do outro com o propósito
de dele falar mal; é aquela que, com a sua língua, causa destruição ao próximo.
Essa definição se encaixa bem com a
ideia de akel-kartsa no aramaico (o devorador-acusador) e do diabolos
(diabo) no grego.
Temos uma repetição do quanto isso é
abominável a YHWH no salmo abaixo:
Não terá
firmeza na terra o homem de {má} língua [ish lashon]; o mal perseguirá o homem
violento até que seja desterrado. (Tehilim/Salmos 140:11)
A tradução literal de ish lashon
é “homem de língua”. Um “homem de língua” não terá firmeza na
terra, isto é, será arrancado dela.
Um homem de língua é literalmente um
homem que se deixa levar pela língua, ou seja, um homem falador, alguém que
fala dos outros.
Hora de Refletir
É hora, querido leitor, de uma boa
reflexão: Será que você tem sido um diabo (diabolos)? Alguém que tem
destruído pessoas, relacionamentos, vidas, comunidades, amizades. etc. com a
sua língua?
Porque se nos dedicarmos a começar a
falar das pessoas que erram, de seus defeitos, de seus problemas, cabem duas
perguntas: A primeira e mais óbvia delas é: Quem sobreviverá à nossa língua, se
somos todos pecadores que carecem da glória de Elohim? (Rm. 3:23)
A segunda pergunta é: Será que não
estamos fazendo isso para fugir do mal que se encontra em nossa própria vida?
Será que estamos sendo feridos, e por isso temos ferido outros? Ou talvez
estejamos tendo dificuldade com nossa própria carnalidade, e precisamos
desesperadamente acreditar que não somos tão ruins assim, e por isso somos
radicais com o outro?
Será que você é um diabo (diabolos)?
A pergunta pode assustar, tenho plena consciência disso. E ela é proposital,
pois visa chamar a atenção para um assunto que é extremamente importante nas
Escrituras, mas que é ampla e largamente ignorado. E é hora de tratarmos esse
mal.
Antes de nos preocuparmos com batalha
espiritual, ou com qualquer tipo de mal exterior, tratemos o diabolos
(diabo) – aquilo que devora ou que destrói vidas – que existe internamente!
Para isto, procuremos conter a nossa
língua, desviando-a do mal (no hebraico: rá), isto é, de causar destruição.
Antes, que nossa língua possa ser usada para edificar vidas. Em outras
palavras: usemos nossa língua para reparar estragos da destruição (rá) ao invés
de destruir.
Hora de Agir
Vivemos em tempos em que quase não há
amor (Mt. 24:12) em razão da anomia. Vidas estão destruídas, pessoas sofrem,
carecendo até mesmo de um propósito para viver. Ocupar nossas línguas
diabolicamente, isto é, destruindo, é mais do que cometer o mal. É um
desperdício de tempo. Porque poderíamos usar desse tempo para construir. Porque
não há tempo a perder.
Encerro relembrando as palavras de
Yeshua, porque elas devem ser o cerne de nossas vidas:
Bem-aventurados os pacificadores, porque eles serão chamados filhos de Elohim.
(Matitiyahu/Mateus 5:9)
Shalom, no hebraico, geralmente é
traduzida como paz, é muito mais do que isso. Shalom é plenitude, totalidade. E
é bem-aventurado aquele que, com sua língua, constrói para o próximo uma
esperança de vida.
Esse, verdadeiramente, supera as obras
do mal.
Sha'ul
Bentsion
Texto revisado por Francisco Adriano Germano
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