A parashá desta semana, Ki Tavô,
inicia-se com a mitzvá de bikkurim (primícias), a qual determina que levemos os
primeiros frutos de nosso campo ao templo como expressão de gratidão a Elohim.
A Torá declara que ao apresentarmos esses primeiros frutos, devemos fazer a
seguinte declaração:
"V'atah hinei
heiveisi... - E agora, eis que eu trouxe os primeiros frutos da terra..."
(Dt 26.10)
O Midrash nos diz que três
palavras nesta passagem nos ensinam a maneira correta de dar, pois, assim como
a nação é responsável por prover os Kohanim (Sacerdotes), também somos
responsáveis pelos necessitados.
1. "V'atah - e agora"
implica imediatismo - vivacidade. A tsedacá deve ser dada com prontidão, pois
qualquer atraso pode prolongar o sofrimento dos necessitados. Além disso, dando
imediatamente, sem procrastinação, demonstramos nossa sensibilidade à dor do
destinatário, e isso, por si só, é terapêutico. O conhecimento de que alguém
realmente se importa e entende a urgência da situação, eleva os espíritos dos
necessitados e lhes dá esperança.
2. "Hinei - Eis." A
palavra conota alegria, felicidade. É essencial que, quando damos, o façamos
com o coração cheio, com um sorriso e uma palavra gentil. Ofertando dessa
forma, protegemos o indigente do constrangimento e permitimos que ele mantenha
sua dignidade. Mendigar é uma experiência humilhante, e os doadores devem fazer
todo o possível para proteger os pobres da humilhação.
3. "Heiveisi - eu
trouxe." Essa palavra indica que aquilo que ofertamos aos necessitados não
é realmente nosso dom, mas um dom que nos foi confiado por Elohim e que devemos
compartilhá-lo com outras pessoas. Ao ofertarmos com o coração, possuindo as
qualidades mencionadas anteriormente, ofertamos a única coisa que podemos dar
realmente, pois o dinheiro não é nosso. Estes são os critérios mais importantes
a serem lembrados em relação à tzedacá. Depois de absorvê-los, toda a nossa
maneira de ajudar o próximo será diferente. Isso nos transformará
espiritualmente, não com o sentimento de auto engrandecimento que,
infelizmente, muitas vezes caracteriza o doador.
E te alegrarás por
todo o bem que o YHWH teu Elohim te tem dado a ti e à tua casa
(Deuteronômio
26:11a)
Podemos ter algumas dificuldades
com esta passagem. O mandamento refere-se principalmente àqueles que
trabalharam em suas colheitas. Certamente, na sequência de tal conquista, eles
não precisariam ser instruídos a serem felizes. Eles tinham todos os motivos
para se alegrar e ficarem satisfeitos. Mas aqui, descobrimos a perversidade da
natureza humana, que nunca permite que um homem se contente com o que possui.
Mesmo tendo sucesso, ele permanece inquieto. Ele deseja mais e mais novamente.
E pior, ele mede sua colheita, suas realizações e as dos vizinhos, e se eles colherem
mais, seu ciúme o consome e sua alegria é prejudicada. É esse ciúme que rouba
uma pessoa da sua paz de espírito, sua felicidade e contentamento, e gera amargura,
ganância e ódio.
Para superar esses sentimentos
negativos, a Torá nos ordena a apreciar tudo o que nos foi dado por Elohim. Ele
sabe o que precisamos para o nosso bem-estar, e devemos nos condicionar a
acreditar que se Ele não nos deu, obviamente, podemos ficar sem ele.
Assim, em vez de lamentar o
que nós não temos, alegremo-nos aquilo que temos. Se absorvermos esse
princípio básico, se tivermos em mente que é Elohim quem está no comando, que é
Ele quem nos supre em todas as nossas necessidades, seremos abençoados com
simcha hachaim, uma profunda alegria na vida. Encontraremos satisfação em nosso
próprio destino, pois perceberemos que não precisamos de mais. Esse espírito de
simcha hachaim é a chave para se obter a paz de espírito, mas se a perdermos de
vista, subscreveremos nossa própria ruína.
Esse conceito de simcha hachaim
está na raiz do hakara hatov, a gratidão, que é um dos pilares básicos dos
princípios de nossa fé. O sentimento de hakara hatov é tão crucial para o
serviço adequado a Elohim, que no final da parashá, somos informados de que o
exílio aconteceria devido a não termos sido capazes de servir a Elohim com
alegria e bondade de coração.
Mas, alguém poderia protestar,
isso não entra em conflito com o ditado de que o Templo foi destruído por causa
do ódio infundado entre o povo? Após um exame mais detalhado, perceberemos que
não há dicotomia entre esses dois ensinamentos, pois, como foi explicado,
quando alguém não está feliz, quando não está satisfeito, a raiz de seus
sentimentos é "preciso de mais!" E tais sentimentos facilmente
levam a ressentimentos e ciúmes, culminando em ódio.
Aqueles que se rendem a seus
olhos avarentos nunca ficarão satisfeitos, e as consequências de seu
descontentamento serão a sua própria ruína. Sempre haverá alguém mais rico,
cuja casa é maior, mais inteligente ou mais bonito etc., por isso a Torá nos
ordena que devemos trabalhar o nosso ego, para encontrarmos a felicidade e
satisfação em todo o bem que Elohim nos concedeu. Em nossa sociedade
competitiva, é fácil cair na armadilha da cobiça, focar no que não temos e não
no que temos.
Se aprendermos a iniciar nossos
dias com a genuína expressão de gratidão, então, esperançosamente, esses
sentimentos nos acompanharão ao longo do dia, se espalharão em todas as nossas
atividades e nos farão perceber que não devemos aceitar nenhum dos simples dons
da vida por certo, pois esses presentes não são tão simples, afinal.
Infelizmente, a maioria de nós
aprecia as bênçãos de Elohim somente depois que as perdemos; só então se percebe
o quanto fomos sortudos. Que triste!
Rebbetzin Esther Jungreis
Texto revisado e adaptado por
Francisco Adriano Germano
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