A Parashá desta semana, Behaalotechá,
aborda temas significativos, como a Mitzvá (mandamento) do acendimento diário
da Menorá (candelabro), os sinais divinos que indicavam quando o povo
devia iniciar ou interromper suas jornadas no deserto, bem como alguns erros
graves cometidos, tanto individual quanto coletivamente, como a queixa por
alimento e o Lashon Hará (maledicência) proferido por Miriam.
Contudo, há um elemento único
nesta Parashá que a distingue das demais: no meio da narrativa dos pecados do
povo, há uma interrupção abrupta. De forma surpreendente, a Torá insere os
versículos:
Acontecia que, partindo a
arca, Moisés dizia: Levanta-te, Senhor, e dissipados sejam os teus inimigos, e
fujam diante de ti os que te odeiam. E, pousando-a, dizia: Volta, ó Senhor,
para os muitos milhares de Israel.
Bamidbar/Números 10:35-36
Segundo o Talmud (Shabat 116a),
esses dois versículos, destacados no texto por dois "Nun" invertidos,
foram deslocados de seu contexto original para criar uma separação entre dois
dos três episódios de transgressões cometidas pelo povo. O primeiro foi a
partida precipitada do Monte Sinai, logo após o recebimento da Torá — comparada
pelos sábios a crianças que fogem da escola, aliviadas por acreditarem que, ao
se afastarem daquele local sagrado, não receberiam novos mandamentos. O segundo
episódio ocorreu após uma jornada contínua de três dias, quando o povo se
queixou do ritmo intenso da viagem imposta por Elohim. O terceiro foi a
insatisfação com o Man (Maná), o alimento celestial, acompanhada do
desejo por carne.
O Rav Zev Leff ensina que a chave
para compreender essa interrupção está na importância da constância no serviço
a Elohim. O ideal de avodá (serviço espiritual) é descrito em:
Quando guardares todos estes
mandamentos, que hoje te ordeno, para cumpri-los, amando a YHWH teu Elohim e
andando nos seus caminhos todos os dias.
Devarim/Deuteronômio 19:9
Ibn Ezra (Rav Avraham ben Meir
zt”l, 1092–1167, Espanha) interpreta a expressão “todos os dias” como um
chamado à continuidade ininterrupta — uma vida marcada por consistência e
perseverança.
A Torá, portanto, interrompe a
sequência de transgressões para destacar a incoerência do povo: se houve
disposição e energia para fugir do Monte Sinai e da responsabilidade
espiritual, por que faltou vigor para seguir rumo à Terra Prometida, onde se
cumpririam mais Mitzvót? A crítica divina é clara: “Meus filhos, para
fugir da Torá vocês têm forças, mas para caminhar em direção à realização do
Meu propósito, vos falta ânimo?”
A escolha do "Nun"
invertido não é aleatória. De acordo com o Talmud (Shabat 104a), a letra
"Nun" simboliza fidelidade e constância. O "Nun" invertido,
portanto, representa a falha oposta: a inconsistência e a contradição interna
do povo. Justamente por isso, os versículos entre os "Nunim"
descrevem o antídoto à inconstância: a submissão total à vontade divina,
expressa nas proclamações de Moshé diante da movimentação ou parada da Arca.
As jornadas no deserto foram,
assim, um teste contínuo de emuná (fé). Apesar das dificuldades, o povo
precisava alinhar-se com a vontade de Elohim, independente das circunstâncias. Servir
ao Eterno apenas nos dias bons não é suficiente; a verdadeira maturidade
espiritual se revela na perseverança diante da adversidade.
Essa reflexão se alinha
perfeitamente com os ensinamentos de Yeshua HaMashiach, que exortava seus
discípulos à fidelidade constante, mesmo sob perseguição, sofrimento ou
desânimo. Yeshua afirmou:
Se alguém quer vir após mim,
negue-se a si mesmo, tome diariamente a sua cruz e siga-me.
Lucas 9:23
Note-se o termo “diariamente”
— o mesmo princípio ensinado por Moshe e pelos profetas: a fidelidade diária, a
constância na caminhada com Elohim.
O apóstolo Paulo (Shaul) também
reforça essa ideia ao instruir Timóteo:
Pregue a palavra, esteja
preparado a tempo e fora de tempo, repreenda, corrija, exorte com toda
paciência e doutrina.
2 Timóteo 4:2
Assim como no deserto, onde o
povo deveria se mover ou parar conforme a Shechiná, também os discípulos
de Yeshua são chamados a seguir o Espírito de Elohim com submissão e
constância, não conforme seus próprios desejos, mas conforme a direção divina —
mesmo que esta contrarie sua zona de conforto.
O Rav Shimshon Raphael Hirsch
zt”l (1808–1888) observa que esta Parashá marca o fim de uma fase de preparação
e o início de um período de rebeliões, que culminaria na tragédia dos espiões,
na destruição do Beit Hamikdash e no exílio. A raiz de toda essa decadência? A
falta de coerência e perseverança no serviço divino.
Portanto, nosso chamado é o
mesmo: levantar as letras “Nun” que estão caídas, restaurar a fidelidade e a
constância em nosso serviço a Elohim, para que sejamos encontrados firmes e
irrepreensíveis na vinda de nosso Mestre, Yeshua HaMashiach.
Sede firmes, inabaláveis,
sempre abundantes na obra do Senhor, sabendo que, no Senhor, o vosso trabalho
não é vão.
1 Coríntios 15:58
Somente com constância e
coerência poderemos retornar plenamente a Jerusalém, ao Beit Hamikdash
restaurado, para servirmos a Elohim em plenitude.
R' Efraim Birbojm
Texto adaptado com acréscimos
messiânicos por Francisco Adriano Germano
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